Para o governo, cloroquina e provocação à China estão à frente da vacina

Isso chegou longe demais, com autoridades ausentes, militarização do governo e medicamentos ineficazes distribuídos como salvação

  • Por Álvaro Alves de Faria
  • 12/05/2021 12h56
FERNANDO MORENO/AGIF - AGÊNCIA DE FOTOGRAFIA/ESTADÃO CONTEÚDO Caixa de hidroxicloroquina Governo federal estimulou uso da cloroquina como tratamento precoce no combate à Covid-19

Entre nós, a campanha de vacinação no Brasil é uma esculhambação. Eu poderia usar uma palavra menos grosseira. Sei disso. Essa palavra é chula. Podia usar, por exemplo, melancólica, lastimável, triste. Desculpem-me, portanto, usar essa expressão particularmente que não gosto, mas ela explicar melhor o que sinto diante de tudo que vem acontecendo neste país no que diz respeito à vacinação. E vem acontecendo por culpa de um governo que nunca se importou com o coronavírus, desde o início, com decisões que ainda causam perplexidade. Não foram decisões tomadas por equívoco. Não. Foram propositais, para criar problema mesmo para os brasileiros. Estamos pagando por isso. Não existe vacina. Uma campanha de vacinação em que as vacinas chegam a conta-gotas. Recebemos os restos. Somos um país sem rumo, é verdade, mas isso chegou longe demais, com autoridades ausentes, militarização do governo, general ministro da Saúde, medicamentos ineficazes distribuídos como salvação.

E a vacina? Ah, a vacina pode ser substituída por comprimidos de cloroquina, e por isso o Exército produziu muitos milhões de comprimidos do medicamento, que nada tem a ver com a Covid-19. Nada. Mas a ordem superior determinou que a cloroquina é a salvação de todos. São mais de 420 mil brasileiros mortos pelo vírus e isso ainda não serviu de lição. Mas isso não representa nada para aqueles que continuam a negar a existência da doença, mesmo vendo o que acontece no país e no mundo. Não bastasse isso, esse comportamento lastimável, o governo insiste em agredir aqueles que poderiam nos vender as vacinas ou os insumos para produzi-las aqui. A última agressão foi um verdadeiro delírio. Só pode ser loucura. Numa cerimônia recente, o presidente Bolsonaro chegou a sugerir que a China fabricou o vírus. Não citou o nome,  mas, evidentemente, falava do país que nos fornece a CoronoVac.

A China, por sua vez, observa e reage. Ninguém está no mundo para sofrer agressões de toda ordem. O mais deplorável é que, algumas horas depois, Bolsonaro negou que tenha agredido os chineses. Negou de uma maneira mentirosa e constrangedora, já que está tudo gravado para quem quiser ver. A China responde com as armas que tem nas mãos. Retarda o envio dos insumos para o Instituto Butantan, em São Paulo. E a vacinação é suspensa em várias regiões do Brasil, com os mortos sendo empilhados e sepultados nas milhares de covas espalhadas no país, com suas pequenas cruzes azuis e algumas fitas coloridas. E tem mais: a vacina foi sempre tratada com desprezo. A Pfizer esteve por aqui oferecendo seu produto antes da pandemia começar, porque a ciência sabia o que estava por vir. Mas o governo negou-se a encomendar. Negou-se pelo simples prazer de negar. Quando viu o tamanho e a gravidade da crise sanitária, procurou a vacina, só que não tinha mais. Por isso a vacinação no Brasil é uma grande esculhambação. Uma vergonha. Representa mais um desprezo para as milhares de famílias em luto, ou famílias que desaparecem inteiras por falta de hospitais. Uma esculhambação em tudo, que vai além da vacinação. Muito além.

A vacinação é a base tudo, sem ela não existe medicamento algum para barrar a Covid-19. Faltam vacinas para os que conseguiram tomar a primeira dose e necessitam da segunda. Vacinações são adiadas, os postos de saúde fecham. Não existe vacina, e um país como o Brasil talvez não a mereça mesmo, só que o povo é quem sofre nas mãos de governantes ausentes, que primam por certa delinquência ideológica difícil de acreditar. Agora temos um quarto ministro da Saúde, que já entrou nesse jogo covarde. Ontem, o novo ministro disse, todo pomposo na TV, que o Brasil acabara de comprar 100 milhões de doses da Pfizer. Mas, no final da conversa, comunicou que são vacinas para o fim do ano. Quer dizer: o Brasil pega o resto, as migalhas, quando ninguém precisa mais. Falta sentimento a essa gente. A campanha da vacinação vai se arrastar de maneira humilhante. O Brasil se transformou em assunto internacional, merecendo manchetes só dedicadas aos grandes crimes contra a humanidade. O que se comete no Brasil é um crime contra a humanidade. E o noticiário toda hora fale em milhões e milhões de vacinas. Mas onde estão essas vacinas? A campanha da vacinação é vergonhosa. As vacinas chegam aqui como esmola de outros países. Fizemos por merecer, pela soberba de governantes que não enxergam um palmo diante do nariz. O Brasil precisa de um povo.

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