O papel do vice em um processo de impeachment
A ala radical do bolsonarismo afirma que o vice-presidente Mourão é um ‘traíra’, mas ele dá claros sinais de lealdade, mesmo sabendo que não fará parte da chapa em 2022
Não existe um impeachment sem a participação do vice. Mesmo que seja apenas o sinal verde para o início de articulação. Foi assim no impeachment do ex-presidente Fernando Collor, quando Itamar Franco apenas consentiu e apoiou a abertura do processo. No caso da ex-presidente Dilma Rousseff, o papel do vice-presidente Michel Temer foi mais efetivo. O então assessor e ex-deputado Eliseu Padilha montou um escritório do impeachment com detalhes de votos e o que queria cada um dos parlamentares. Ele sempre foi famoso na competência de montar mapa de votação. Não há neste momento clima de aprovação do impedimento do presidente Jair Bolsonaro no Congresso, mas o capitão sabe que não pode descuidar deste flanco permanentemente aberto para quem não tem maioria parlamentar. Todos os líderes estão, portanto, de olho nos sinais do general Hamilton Mourão, vice-presidente da República.
A ala mais radical do bolsonarismo me alerta que o vice-presidente Hamilton Mourão “é um traíra”. Não concordo e até acho que ele dá sinais claros de que é leal, mesmo depois de crises e a certeza de que não será de novo o vice numa chapa para a reeleição. Líderes importantes no Congresso dizem que vão ao seu gabinete e, quando insinuam qualquer conversa neste sentido, ele a corta. “Não dá nem entrada para uma conversa”, me disse um líder que conversa com o general com frequência. É bom saber que Mourão conversa com políticos e tem uma grande empatia com deputados e senadores. O ex-presidente José Sarney tem forte ligação com ele. Sarney não se cansa de fazer elogios e chama a atenção para o preparo intelectual do amigo. Isto não quer dizer que o emedebista está articulando ou apoiando um movimento para transferir o poder.
Nas Forças Armadas, os sinais são claros de que há inquietação com a presente confusão entre militares e governo. Generais conversam com jornalistas e chamam para conversas reservadas com mensagem clara: “Uma coisa é o governo e outra é o Estado”. A informação, maior do que o “informe”, é de que o Exército conversa sobre o momento político e já fechou que os militares são parte integrante do Estado, não do governo. Fica claro em todas as conversas com militares que se incomodaram com a frase já corrigida pelo presidente Jair Bolsonaro de “que as Forças Armadas é que decidem se o povo vai viver uma democracia”. Na verdade, o presidente diz que “as Forças Armadas são pilares importantes da democracia”. São, mas não o poder moderador, e a caserna não reivindica esta posição. O resumo é que os militares não estão fechados com qualquer decisão de Bolsonaro, principalmente os comandantes da ativa. Há resistências importantes conhecidas pelo governo.
O momento é tenso nas relações do presidente com o vice. Mesmo assim, Mourão continua firme e assegura que não conspira e que continua leal. Decidiu até exonerar o assessor Ricardo Roesch Morato Filho, que teve troca de mensagens vazada. Ele sugeria início de articulação para o impeachment. O deputado Kim Kataguiri, do DEM de São Paulo, confirma que conversa com assessores do vice-presidente. E chega a dizer que é uma espécie de sinal verde, sem articulação formal. Um dos coordenadores do MBL, Kataguiri é defensor do impeachment já, mas não se alinha com o PT e outros defensores do processo na esquerda. Nenhum líder de peso defende a abertura do processo de impeachment. Pelo contrário, a avaliação é de que a abertura de um processo grave assim provoca paralização da pauta e provoca repercussões na economia.
*Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião da Jovem Pan.
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