Europa avança com desmatamento zero e coloca exportação de soja, carne bovina e café do Brasil em risco

Política europeia entra em conflito com o Código Florestal Brasileiro, um dos mais avançados do mundo, e deverá gerar impacto negativo no desenvolvimento socioeconômico das novas fronteiras do agro

  • Por Kellen Severo
  • 26/11/2021 09h00 - Atualizado em 26/11/2021 09h19
J.F.Diorio/Estadão Conteúdo - 10/10/2017 Pasto com dezenas de bois espalhados Exportação de soja, carne bovina e café será prejudicada se União Europeia aprovar política de desmatamento zero

A Comissão Europeia anunciou há uma semana um pacote de medidas para autorizar apenas a importação de produtos com desmatamento zero. Significa dizer que alimentos como soja, carne bovina e café, ou seja, originados de áreas desflorestadas, não estarão autorizados a entrar na região, mesmo seguindo as leis ambientais brasileiras. De acordo com o documento, o principal impulsionador do desmatamento é a ampliação de áreas agropecuárias. O comissário europeu de Meio Ambiente disse que “a proposta visa não apenas o desmatamento ilegal, mas todo desmatamento impulsionado por expansão agrícola”. Esse ponto entra em conflito com o Código Florestal Brasileiro, considerado um dos mais avançados do mundo, que estipula limites de preservação obrigatória em cada região e autoriza percentuais de supressão de mata nos diferentes biomas.

A política do desmatamento zero deverá gerar impacto negativo no desenvolvimento socioeconômico das novas fronteiras do agronegócio no Brasil, como no Salba (Sergipe, Alagoas e Bahia) ou no Matopiba (Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia). Essas regiões terão um desestímulo para ampliação agrícola por potenciais restrições de acesso ao mercado externo. A barreira da União Europeia para produtos fruto de desmatamento legal foi classificada pelo ministro do Meio Ambiente, Joaquim Leite, como protecionismo climático e uma afronta à soberania brasileira. Para a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, a proposta do bloco deveria ser revista. Já a Sociedade Rural Brasileira afirma que a iniciativa está fora do contexto dos recentes acordos internacionais e ignora a legislação do Brasil.

Entidades do agronegócio estão preocupadas também com a classificação do Brasil no sistema europeu que será criado, com índices de baixo, médio ou alto grau de risco em relação ao desmatamento. O temor é que, a depender da categorização que o país se enquadre, os esforços para rastrear a cadeia tenham pouca relevância para garantir acesso ao mercado europeu, pois a reputação ambiental brasileira seria uma barreira de entrada. Nesta semana dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais mostraram avanço de 21% do desmate na Amazônia Legal.

A Europa, formadora de opinião que é, pode influenciar outros países a seguir a mesma onda, com barreiras de acesso ligadas à reputação. Hoje o Brasil é o principal fornecedor de soja (39%), carne bovina (21%) e café (30%) para o bloco, de acordo com dados apresentados pela Comissão Europeia na nova fase do acordo verde. As sugestões da comissão terão que ser apreciadas pelo Parlamento Europeu e Conselho Europeu. Ainda há muitas dúvidas sobre o funcionamento das regras. A ideia é que todo produto fruto de áreas desmatadas após dezembro de 2020 estejam restritos. Se a medida for aprovada, veremos uma série de mudanças na cadeia global de alimentos.

*Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião da Jovem Pan.

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