A segunda fase do plano de Trump determinará o futuro de Gaza

Após semanas de cessar-fogo e o cumprimento dos termos por ambos os lados, israelenses e palestinos se preparam para estágio que poderá reconstruir o enclave aos moldes de uma Palestina sonhada há décadas

  • Por Luca Bassani
  • 09/12/2025 07h00
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Eyad Baba/AFP Integrantes da Defesa Civil usam uma escavadeira para procurar os restos de vítimas nos escombros de um prédio destruído no campo de refugiados de Bureij, no centro da Faixa de Gaza Integrantes da Defesa Civil usam uma escavadeira para procurar os restos de vítimas nos escombros de um prédio destruído no campo de refugiados de Bureij, no centro da Faixa de Gaza

Apesar da incredulidade dos palestinos e ceticismo da comunidade internacional, o plano de paz para a Guerra em Gaza, idealizado pelo presidente norte-americano Donald Trump, tem conseguido se manter em vigência há mais de dois meses. A proposta ambiciosa apresentada pelos enviados especiais do republicano ao Oriente Médio levou muitos países árabes e europeus a duvidarem de sua eficácia e longevidade. A estratégia acertada dos Estados Unidos foi se colocar como garantidor da paz, pressionando de maneira incisiva seus parceiros islâmicos e os seus aliados israelenses, uma posição consideravelmente ponderada se comparada com posturas adotadas por Washinton DC em um passado recente.

A primeira fase tinha como objetivo principal para Israel a libertação de todos os 20 reféns israelenses vivos e a repatriação de todos os 28 corpos de reféns mortos ao longo do período nos cativeiros de Gaza. Para o Hamas, o foco era ganhar tempo de reação política depois de anos de fortes bombardeios e perda de popularidade interna entre os palestinos. De fato, todos os 20 sequestrados vivos retornaram às suas famílias e 27 corpos foram devolvidos, enquanto os bombardeios constantes cessaram e o exército israelense se retirou para o perímetro combinado. Com a possibilidade dos restos mortais de Ran Gvili serem entregues aos israelenses nos próximos dias, muitos se perguntam quando oficialmente começará a implementação da fase dois do plano de Donald Trump.

Os mediadores árabes, turcos, americanos e israelenses se reuniram dezenas de vezes no Egito e Jordânia, e um dos poucos consensos era que um grupo terrorista não poderia continuar a determinar o futuro de 2,3 milhões de palestinos. O acordo selado previu, com o apoio de todas as partes, que o Hamas abandonaria suas funções político, militares e administrativas e que Gaza passaria a ser governada de forma interina por um quadro de tecnocratas palestinos que não só buscariam a pacificação, mas trariam viabilidade socioeconômica para uma geração traumatizada pelos constantes conflitos. 

Os termos colocados por Trump e assinados por todos são bem claros ao dizer que no início da fase 2, o grupo terrorista sunita deveria entregar suas armas, abandonar as atividades terroristas e militares e escolher o exílio para países que os quisessem receber. Em seguida, uma espécie de Conselho da Paz com a presença de notáveis palestinos de diversos setores, teria a hercúlea tarefa de transformar milhões de toneladas de escombros em uma nação funcional.

A premissa utilizada foi bastante sagaz ao dar a nacionais palestinos a capacidade de decidirem por seu próprio destino, retirando das mãos de uma força militar de ocupação qualquer responsabilidade pelo futuro de outro povo e outro país. O Conselho da Paz e o comitê dos tecnocratas trazem não apenas experiência internacional, mas legitimidade cultural e étnica para administrar uma região tão flagelada pelas guerras. 

Entretanto, o caminho parece não ser tão fácil. O Hamas fez uma série de declarações ambíguas ao longo dos últimos três meses, em alguns casos refutando categoricamente qualquer chance de abandonar o poder e em outros colocando condições para a saída. O ponto fundamental colocado pelo grupo palestino envolve a retirada completa das forças israelenses do enclave, algo previsto também no acordo de Trump, mas não necessariamente de maneira imediatamente sequencial. As questões temporais são fundamentais para se criar confiança entre os beligerantes e dar maior credibilidade aos fiadores do acordo.

Da perspectiva do Hamas, as opções são realmente poucas. Após uma derrota militar, a perda de mais de 70% de seus homens e o enfraquecimento de seus principais financiadores, a negociação por algum tipo de anistia foi o que lhes restou. Alguns ainda vivem na esperança de continuar a vida jihadista em outros cantos do mundo, mas sem a mesma opulência que lhes foi concedida após 16 anos utilizando recursos públicos e privados para fins pessoais. 

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Tudo indica que o caminho para o convencimento passará por algum tipo de manutenção de mordomias aos terroristas que deixarem Gaza, mas a fragmentação ideológica do grupo e o caos logístico trazido por dois anos de guerra pode fazer com que nem todas as facções escolham o mesmo destino. Quadros do Hamas com integrantes mais jovens, consideravelmente mais pobres e diretamente atingidos pelas perdas financeira e humanas podem insistir em um caminho de maior radicalização ou de retomada da violência, o que não significaria grandes riscos para Israel do aspecto operacional, mas quebraria a confiança duramente construída e os acordos selados. Por enquanto o momento é de espera, de indagações e de negociações nos bastidores para garantir que a fase 2 seja o início da reconstrução definitiva de Gaza e não a continuação de seu colapso.

*Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião da Jovem Pan.

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