Os caminhos e descaminhos de Romeu Zema para chegar à Presidência
Acompanho os pronunciamentos de cada um dos possíveis candidatos à Presidência; o governador de Minas até disfarça nas linhas, mas, quase sempre, derrapa nas entrelinhas
Gosto de ouvir Romeu Zema falar. Aquele jeitão mineiro de se expressar é sedutor. Além da mineirice, o governador de Minas é firme quando fala dos números do seu Estado. As comparações que faz com o governo anterior impressionam. Segundo suas palavras, ele realmente endireitou as finanças. Por isso, alcançou a extraordinária marca de 64% de aprovação.
Acompanho os pronunciamentos de cada um dos possíveis candidatos à Presidência. Zema é um deles. Presto atenção nas linhas e nas entrelinhas, mais nas entrelinhas. É nessas frestas retóricas que conseguimos “auscultar” o que verdadeiramente um político quer dizer. Alguns são muito hábeis e conseguem ludibriar, em certos casos, imagino, até eles próprios.
Bom gestor
Zema não tem esse perfil. Até disfarça nas linhas, mas, quase sempre, derrapa nas entrelinhas. Gira, rodopia, capota e, no final, deixa rastros que revelam suas reais intenções. Isso não o torna pior ou melhor, apenas confirma a constatação de um fato: a transparência camuflada em meio às espessas nuvens do jogo político.
Como excelente gestor, tem todo o direito de concorrer ao cargo de presidente. Já provou que consegue levar para a administração pública sua competência calejada no mundo empresarial. É um obstinado ceifador de gastos e admirável adepto da livre iniciativa. Tem coerência, pois aplica na prática o que defende na teoria.
Fraco desempenho nas pesquisas
O seu desempenho nas pesquisas nacionais, entretanto, é bastante sofrível. Ao sair das fronteiras mineiras, seus números podem ser comparáveis aos do Cabo Daciolo. Falando nisso, por onde andará Daciolo? De acordo com o levantamento realizado no início do mês pela Genial/Quaest, Zema amarga minguados 4%. É muito pouco para um gestor que se mostrou tão competente. Esses números, porém, são frutos de escolhas equivocadas.
Hoje em dia, Jair Bolsonaro é quem tem cacife para enfrentar Lula com chances de vencer. Mas o ex-presidente está inelegível e, se essa situação não for revertida, ao que tudo indica terá condições de competir aquele que ele indicar.
Atacou o alvo errado
Foi aí que Zema vacilou. Foram vários momentos em que “o galo cantou três vezes”. Alguns foram marcantes. Em entrevista à Globo, ao ser questionado sobre o indiciamento de Bolsonaro a respeito da trama do golpe, se esgueirou:
“Eu não sou jurista, não sou formado em Direito. Sou formado em Administração. Não tive acesso aos autos, mas se há indícios fortes, que seja investigado.”
Essa não é conversa de parceiro. Poderia dizer, por exemplo, que conhecia Bolsonaro há muitos anos e que não acreditava que ele participaria de um golpe. Dessa forma, sem precisar se comprometer, com um simples “não acredito” se mostraria solidário e deixaria uma porta aberta caso algum fato fosse revelado contra o ex-presidente.
Silêncio constrangedor
Além desse episódio, o governador mineiro ficou quieto, não se manifestou para apoiar Bolsonaro. Os bolsonaristas não gostaram dessa atitude. O fato de revelar que o ex-presidente seria o candidato mais viável da direita também não convenceu. Afirmou que o melhor seria ele, mas depois de ressalvar que a Justiça é lenta e acaba gerando dúvida sobre quem será o candidato.
Eis que em novembro de 2022 o galo já havia dado sinal de vida. Em entrevista à Rádio Super 91,7 FM, da capital mineira, Zema afirmou: “O governo federal e a gestão do presidente Bolsonaro não foram felizes na comunicação.” E, após censurar mais algumas vezes o ex-chefe do Executivo, deu a cutucada final: “O presidente Bolsonaro perdeu para si mesmo, devido a uma forma de condução da comunicação.”
Mexeu com a família
E só para completar os três cantos bíblicos, no mesmo 2022 já havia botado as manguinhas de fora. Ao participar de um evento de João Doria, um dos maiores desafetos do ex-presidente, mostrou as garras. Além de criticar Bolsonaro novamente pela conduta equivocada na questão da pandemia, desferiu golpes abaixo da linha da cintura: “Apesar de nós termos 320 mil servidores públicos, não tenho nenhum parente. Então, também temos uma diferença: família para lá, negócios e carreira para cá.” Ulalá, nem um petista faria melhor.
Se é mesmo verdade que um candidato da direita só terá chances se for o próprio Jair Bolsonaro ou um candidato apoiado por ele, com essas declarações Zema, apesar de ser um político que deve estar sempre nas prateleiras superiores, talvez tenha de se contentar com esses míseros 4%. A não ser que os imprevisíveis ventos da política mostrem o contrário. Siga pelo Instagram: @polito
*Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião da Jovem Pan.

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