Auxílio emergencial sem contrapartida é um erro que pode custar R$ 64 bilhões

Está previsto metade dos beneficiados de 2020 e um valor de R$ 200 mensais; pagamento do auxílio sem a aprovação de reformas ou cortes de gastos previstos sinaliza para o investidor aumento da dívida pública

  • Por Samy Dana
  • 16/02/2021 07h39 - Atualizado em 16/02/2021 08h34
ANDRE MELO ANDRADE/MYPHOTO PRESS/ESTADÃO CONTEÚDO Um celular logado no aplicativo da Caixa para o recebimento do auxílio emergencial e notas de dinheiro ao lado do aparelho Equipe econômica acha obrigatório definir as contrapartidas antes

Se havia alguma dúvida sobre a volta do auxílio emergencial, ela já foi desfeita. No Maranhão, o presidente Jair Bolsonaro disse ser quase certo que o auxílio volta em março por mais três ou quatro meses. Ainda não é definitivo o formato. Fala-se em metade dos mais de 70 milhões de beneficiados do ano passado e um valor de R$ 200 mensais. Mas o presidente da Câmara, Arthur Lira, já falou em R$ 300, mesmo valor da última parcela do benefício, paga em dezembro. Segue incerto, no entanto, de onde virá o dinheiro. O ministro da Economia, Paulo Guedes, cobra uma proposta de emenda constitucional (PEC) liberando o auxílio, mas também o corte de gastos – ainda não definidos – para compensar. A equipe econômica acha obrigatório definir as contrapartidas antes. Parecia que ia ser assim depois da eleição da nova cúpula do Congresso, com os dois presidentes, da Câmara e do Senado, sinalizando nessa direção.

Mas no começo da semana, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, afirmou que apontar os cortes não deve atrasar o benefício. Ou seja, à moda das decisões políticas, a volta do auxílio é praticamente certa. Incerto é saber como a conta será paga. É um erro. Retornar o auxílio nesses moldes poderá custar caro para a recuperação da economia. Com os gastos de 2020, a alta da dívida pública pesa na economia. E deve aumentar até R$ 64 bilhões se o benefício voltar a ser pago sem contrapartida. Pagando R$ 300 a cada beneficiário, como foi de outubro a dezembro, o auxílio custou, segundo o Tesouro Nacional, R$ 32 bilhões por mês.

Se for pago a metade dos beneficiários, o custo cai a R$ 16 bilhões. Se ainda por cima forem R$ 200 em vez de R$ 300, como quer o Ministério da Economia, mais uma queda, para R$ 10,7 bilhões. Mas não será nenhuma surpresa se os R$ 300 forem mantidos. A equipe econômica já tentou os R$ 200 no começo do auxílio e o valor, ao chegar ao Congresso, acabou sendo de R$ 600. Sendo de R$ 300, mesmo com 50% de pessoas a menos no programa, o valor de quatro meses do novo auxílio emergencial chegaria a R$ 64 bilhões – R$ 16 bilhões mensais durante quatro meses. Segundo o presidente do Banco Central, Campos Neto, não há espaço fiscal para um gasto de tal magnitude. E o tiro poderá sair pela culatra.

Voltando o auxílio sem a aprovação de reformas da economia ou cortes de gastos previstos, o sinal para o investidor é de que a dívida pública vai subir. Quem investe em títulos públicos passa a cobrar mais para emprestar ao governo. Cedo ou tarde isso acaba em mais inflação, além de uma taxa Selic, dos juros, maior e menos investimento e emprego. Dados vêm mostrando que a retirada do auxílio desacelerou o consumo no começo do ano. Surgem daí defensores da volta também para manter a recuperação. É o pior argumento de todos. Uma coisa é resgatar vulneráveis. Mas não é fazendo o governo gastar mais que a economia vai crescer de forma sustentável.

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