Imposto sobre grandes fortunas não funciona; acabar com as isenções de taxas, sim

O mais eficiente não é cobrar mais de alguns, mas atacar as vantagens que fazem alguns grupos pagarem menos

  • Por Samy Dana
  • 15/01/2021 10h00
Itaci Batista/Estadão Conteúdo Cédulas de R$50 colocadas em sequência Congresso da Argentina instituiu o imposto sobre grandes fortunas temporariamente, a princípio

Com a Covid-19, a desigualdade no país aumentou. Aumenta também a pressão por formas alternativas de compensação. E uma das mais repetidas no âmbito da reforma tributária é a cobrança de um imposto para os mais ricos. Menos porque entra em vigor neste mês um imposto sobre grandes fortunas na Argentina, muito mais porque esse é um tema do momento, com defensores que vão do economista francês Thomas Piketty ao senador americano Bernie Sanders, que chegou a ser o favorito na escolha do candidato democrata à presidência e acabou preterido por Joe Biden. No início de dezembro, o Congresso argentino instituiu a cobrança, temporária, a princípio, para quem tem patrimônio superior ao equivalente a R$ 12 milhões de reais.

Aqui no Brasil, o avanço da ideia envolve a discussão da reforma tributária no Congresso. Para levar a reforma adiante com mais rapidez, é preciso o apoio de todos os partidos. Inclusive dos partidos de esquerda, que, segundo o jornal Folha de S. Paulo, cobram a adoção de um imposto sobre grandes fortunas para facilitar a tramitação. Em teoria, impostos desse tipo podem parecer boa ideia. A pessoa que tem um patrimônio muito alto, mesmo pagando mais imposto, não sai realmente prejudicada a ponto de ter a segurança financeira ameaçada. O dinheiro arrecadado seria usado para compensar os menos favorecidos. Existem, no entanto, dois problemas.

Um é de razão econômica. Como o ministro da Economia, Paulo Guedes, tem ressaltado nas discussões com o Congresso, um imposto a mais sobre os ganhos afasta investimentos. A empresa acaba indo para um país onde não há o tributo. É o motivo, de acordo com um estudo do Insper, para que hoje só Espanha, Suíça e Noruega entre os países da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) tenham imposto sobre riqueza. O grupo já teve 12 integrantes, que foram abandonando o tributo geral, algumas vezes em troca de impostos alternativos, como na França e na Itália, onde determinados ativos são taxados. O outro empecilho é que, segundo a Receita Federal, em documento apresentado à Câmara, a proposta não é prática. Começa pelo básico: como calcular o que é uma fortuna? Será que dinheiro e imóveis ou também obras de arte ou mesmo direitos autorais? Cada um tem seu valor, que nem sempre, aliás, quase nunca, é fácil de avaliar.

Além do mais, podem ser usados artifícios como dividir o patrimônio com outra pessoa, como a mulher, o marido ou os filhos. Ou mesmo deixar parte do patrimônio em outro país. Isso também vale, inclusive, para outro imposto do qual se fala bastante, o imposto sobre herança. Basta distribuir a herança em vida, por exemplo, para anular a imposição de um tributo. O mais eficiente, como também aponta a Receita, não é cobrar mais de alguns, mas atacar as vantagens que fazem alguns grupos pagarem menos. São as vantagens tributárias, isenções e o refinanciamento eterno de dívidas de impostos, como o Refis, o parcelamento de dívidas com a União com desconto. É válido discutir modos de combater a desigualdade em um país com as disparidades do Brasil. Mas o caminho não envolve soluções fáceis. Muito menos ter mais imposto.

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