Silêncio de Bolsonaro é ‘praticamente um ato de hostilidade’ a Joe Biden, afirma ex-embaixador

Para Roberto Abdneur, a falta de posicionamento pode demonstrar que o presidente brasileiro apoia os questionamentos eleitorais feitos por Donald Trump

  • Por Jovem Pan
  • 09/11/2020 10h23 - Atualizado em 10/11/2020 08h15
Carolina Antunes/PR Presidente Jair Bolsonaro Mensagem foi publicada em resposta a um seguidor de Bolsonaro que pediu para que o governo federal não adquirisse a vacina chinesa

O silêncio e a falta de posicionamento do presidente da República, Jair Bolsonaro, frente a eleição de Joe Biden nos Estados Unidos é considerado mais um erro diplomático do governo brasileiro no cenário internacional. Na avaliação do ex-embaixador do Brasil em Washington, Roberto Abdneur, a postura do presidente de não reconhecer o candidato eleito reforça a ideia que Bolsonaro estaria apoiando os “questionamentos indevidos e sem fundamento” de Donald Trump sobre a eleição. “Bolsonaro fica muito exposto em uma situação de que está remando contra a maré, isso é praticamente um ato de hostilidade ao presidente eleito e expressa uma continuidade excessiva simpatia pelo Trump”, afirma o diplomata em entrevista ao Jornal da Manhã, da Jovem Pan. Abdneur avalia que não há qualquer possibilidade de reversão no resultado da eleição americana, vencida por Biden com resultado confirmado no sábado, 07. Segundo ele, mesmo com os questionamentos e a judicialização do pleito, não há mera chance de que a vitória seja dada a Trump. Por esse motivo, a falta de reconhecimento do presidente brasileiro quanto a vitória do democrata, somada a torcida declarada pelo republicano, afeta ainda mais a relação entre os países.

“Bolsonaro cometeu um erro diplomático muito sério ao se colocar em uma posição de inferioridade em relação a Trump, de seguir posturas e posicionamentos de interesse dos EUA, às vezes, em detrimento dos interesses brasileiros. Ao fazer isso ele pendurou as relações entre os países na pessoa do Trump e não conduziu as relações nos últimos dois anos como de Estado a Estado e que passam por cima dos governos de transição. O resultado [da eleição nos EUA] se dará no dia 6 de janeiro quando o Congresso reunido recebe os votos do Colégio Eleitoral, os consagra e declara eleito o vencedor. Não faz sentido tardar em se manifestar positivamente em relação ao presidente eleito, todos os presidente sul-americanos, centro-americanos, europeus e africanos e asiáticos já se dirigiram ao Biden.”

Além da falta de posicionamento, outros temas podem dificultar ainda mais a relação entre o futuro governo dos Estados Unidos com o Brasil. Abdneur avalia que, assim como na Europa, o governo Bolsonaro é criticado pelos democratas pelas questões ambientais, queimadas e desmatamento na Amazônia. Os questionamentos e a cobrança por uma postura mais firme e ambientalmente responsável do governo devem se intensificar e exigir uma mudança na política externa brasileira. “Estamos acumulando erros diplomáticos e colocando o Brasil em uma posição de isolamento, de perda de credibilidade. Não temos relações boas com os europeus, agora, vamos ficar com relações ruins com os Estados Unidos. Estamos com relações abaladas com a Argentina e com os nossos vizinhos. A eleição de Biden põe em xeque essa política externa e ambiental. O governo deveria tomar atitudes firmes, até drásticas, de afirmar seu compromisso com a preservação da floresta e alterar a política externa para haver uma recuperação da presença do Brasil no plano internacional.”

Roberto Abdneur nega que exista uma tentativa internacional de explorar a Amazônia ou um questionamento da soberania do Brasil e explica que o objetivo é preservar a região e, com isso, contribuir para a luta contra as mudanças climáticas. O diplomata pontua que uma aproximação entre o vice-presidente Hamilton Mourão e a vice-presidente dos Estados Unidos, Kamala Harris, seria benéfica para estreitas as relações abaladas pelos “erros diplomáticos do governo” e facilitar o debate sobre as políticas ambientais que devem ser adotadas. “Ajudaria muito a evitar maiores tensões na relação Brasil e Estados Unidos e serviria de veículo para que o governo brasileiro evidencie uma atitude mais firme quanto ao que o vice-presidente está fazendo no combate aos fatores de destruição da floresta. O que está em jogo são interesses fundamentais do Brasil, e infelizmente, o presidente, seus chanceleres e o ministro do meio ambiente tendem a piorar a nossa situação no plano internacional.”

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