Regalias de parlamentares só vão acabar se reformarmos o sistema eleitoral brasileiro
Além dos salários, deputados federais recebem auxílio-moradia, possuem a ‘verba de gabinete’ e a ‘cota parlamentar’; na atual conjuntura, continuaremos meros espectadores de um espetáculo de horrores
Esta semana, outra notícia para o rol das incongruências do sistema parlamentar brasileiro. No última quarta-feira, 31, foi anunciado pelo atual presidente da Câmara, Arthur Lira, um aumento de 171% – qualquer semelhança com esse número é mera coincidência – no valor do reembolso dos deputados em gastos com a saúde. A desculpa para a inclusão de R$ 85 mil na verba existente foi atribuída à atual inflação e à tecnologia utilizada em procedimentos médicos. Tudo isso face a um contingenciamento de salários e benefícios na iniciativa privada, frente à crise decorrente da pandemia do coronavírus. Uma agulha no palheiro, diante de uma realidade que só poderá ser modificada se houver uma reforma no sistema eleitoral brasileiro. Na atual conjuntura, continuaremos meros espectadores de um espetáculo de horrores que se repete ano após ano.
O salário de cada deputado federal é de R$ 33.763,00, valor que pode ser descontado por conta de faltas não justificadas; auxílio-moradia de R$ 4.253,00 ou um apartamento para morar, caso não queira ocupar um dos apartamentos funcionais oferecidos pela Câmara; além de uma verba de R$ 111.675,59 para a contratação de até 25 funcionários, denominada “verba de gabinete”. No caso, salário, férias e auxílio-moradia desses funcionários não são pagos pela verba disponível do gabinete, e sim por recursos da Câmara. Mas pasmem, o despropósito não para por aqui. Há também a Cota para o Exercício da Atividade Parlamentar (CEAP), a famosa “cota parlamentar”, que pode variar de um estado para outro, de R$ 30.788,66 a R$ 45.612,53. Em um levantamento de cálculos, realizado pelo jornalista Lúcio Vaz, da Gazeta do Povo, em 2018, somando todos os gastos, cada deputado custou ao contribuinte cerca de R$ 278 mil por mês, ultrapassando R$ 2 milhões por ano. Melhor nem fazer os cálculos atualizados para não ter que incluir mais um desatino, imposto a nós, cidadãos brasileiros, que somos convidados a assistir “o circo pegar fogo”, sem mangueiras para apagar o incêndio da insensatez do sistema eleitoral brasileiro, que não permite que a nossa escolha na urna possa ser representada na Câmara, de modo a defender nossos direitos e nossas intenções de voto.
No ano das eleições de 2018, de 513 deputados eleitos na Câmara, somente 27 deles dependeram dos próprios votos para se eleger, o que representa 5,26% do total. Isso quer dizer que esses 27 deputados eleitos atingiram ou ultrapassaram o quociente eleitoral e obtiveram uma cadeira na Câmara dos Deputados por votação própria, sem precisar dos votos totais recebidos pelo conjunto do partido ou pela coligação. Para que isso possa ser minimizado, há sim uma saída, e a esperança está no voto distrital como forma de ampliação da representatividade nas eleições para a Câmara dos Deputados. Nesse sentido, nos dias atuais, a representatividade nas eleições é deturpada, uma vez que os votos são dados a ela, mas quem recebe são os outros candidatos em que o eleitor não votou. Os argumentos para essa modalidade giram em torno da ideia de que o “puxador” de votos é um dos representantes do partido, assim, quem vota nele estará defendendo o ideal do partido. Sem noção de realidade quem pensa dessa forma, pois muitos candidatos não conseguem se eleger, porém, todos os votos somam para eleger alguém em que o próprio eleitor não votou. E o povo sabe disso?
Com o voto distrital, uma das vantagens é que ganha a eleição quem ganhar no distrito. Além do mais, há uma ligação entre o eleitor e o eleito, de forma muito mais direta. Hoje, no Brasil, é muito comum o eleitor, com o passar do tempo, não se lembrar em quem votou, nem ao menos saber qual político representa sua localidade na Câmara Estadual e Federal, nem ao menos na Câmara Municipal. Com isso, a distância entre políticos e eleitores se torna cada vez maior, e o político não se sente pressionado a prestar contas a ninguém. Com a adesão do voto distrital, cada candidato será filiado a um distrito, onde concorrerá às eleições. Deverá prestar contas a seus eleitores, com os quais está vinculado. Bem diferente do que ocorre atualmente. Hoje, se encaminhamos uma queixa a um deputado, não sabemos quem nos representa de fato. Com o voto distrital, a coisa muda de figura. Existe alguém que conhecemos, foi eleito por nós e nos representa. Simples assim. Além do que, cai bastante o custo da eleição. Nos dias atuais, em uma eleição proporcional, a área geográfica que deve ser coberta pela campanha é do tamanho de quase o Estado ou cidade. Por outro lado, no voto distrital, a campanha será realizada pelo candidato somente em seu distrito.
Além disso, outra vantagem do voto distrital é referente aos pequenos partidos, em que os candidatos que possuem uma verba de campanha reduzida podem priorizar um distrito e focar a campanha nesse local. Importante também ressaltar a redução de poder dos presidentes de partido, em que candidatos se elegem com votos que não lhe pertencem e sim ao partido, deixando-os vulneráveis à burocracia desses partidos. Hora de mudanças para o sistema eleitoral brasileiro. Quando houver uma maior pressão da população para que se institua o voto distrital como forma de representatividade nas eleições para a Câmara, poder-se-á abrir um novo caminho no cenário político do país. Nós, povo brasileiro, nunca desistimos. Por isso, resta uma esperança de que possamos participar de forma mais direta nas decisões apresentadas por representantes legítimos de nossas aspirações, se houver o voto distrital como saída para essa confusão estabelecida, que nos deixa distantes de quem elegemos, e que vai se perdendo no esquecimento de até mesmo em quem votamos. Há uma saída. Basta de tantas regalias e subterfúgios para vantagens a quem não se deve e escassez a quem mais precisa. Lutemos por um Brasil melhor e mais justo.
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