Brexit gera rixa entre Premier League e Associação de Futebol da Inglaterra
A saída do Reino Unido da União Europeia, o famoso Brexit, começará a entrar em vigor no próximo dia 31, mas já provoca mal-estar entre a Associação de Futebol da Inglaterra (FA, na sigla em inglês) e a Premier League e pode enfraquecer o principal campeonato nacional do mundo. Durante o período de transição, entre 1º de fevereiro e 31 de dezembro deste ano, os clubes britânicos poderão ir às compras sem qualquer tipo de restrição, mas a partir de 1º de janeiro de 2021 o impacto do Brexit deverá ser grande.
Jogadores nascidos em países europeus que fazem parte da União Europeia – somados aos atletas que jogam com dupla cidadania, caso de muitos brasileiros – teriam de atender às duras exigências para obter um visto de trabalho no Reino Unido. Para a “elite” dos esportistas, existe uma tabela que determina o número de jogos que o jogador precisa fazer nos últimos dois anos por suas seleções para conseguir o visto de forma automática.
O porcentual varia de acordo com a posição da seleção no ranking da Fifa: posição 1 a 10 – mínimo de 30% de participação nos jogos da seleção; posição 11 a 20 – mínimo de 45% de participação nos jogos da seleção; posição 21 a 30 – mínimo de 60% de participação nos jogos da seleção; posição 31 a 50 – mínimo de 75% de participação nos jogos da seleção.
Os estrangeiros que não atendem esses critérios passam por avaliações individuais. Um exemplo é o brasileiro Douglas Luiz. Revelado pelo Vasco, o volante foi comprado pelo Manchester City em 2017 e não pode defender a equipe, apesar dos pedidos públicos do técnico Pep Guardiola. Por não ter passaporte europeu e não atender aos pré-requisitos para obter visto de trabalho, o jogador foi emprestado ao Girona, da Espanha por duas temporadas. Sua questão legal só foi resolvida nesta temporada, quando ele acabou sendo vendido ao Aston Villa.
Em 2016, a rede “BBC” calculou que 332 jogadores que atuavam nas duas principais divisões do futebol inglês e escocês não cumpririam os requisitos se fossem aplicadas as regras para cidadãos que não pertencem à União Europeia. O argelino Riyad Mahrez e o francês N’Golo Kanté, eleitos melhores jogadores do Campeonato Inglês em 2016 e 2017, respectivamente, são dois exemplos de jogadores que também não receberiam vistos de trabalho na época de suas contratações.
QUEDA DE BRAÇO
A indefinição sobre o Brexit também escancarou um racha entre a Premier League (liga que organiza o Campeonato Inglês) e a FA. Ao contrário do que ocorre no Brasil, a federação nacional na Inglaterra tem como principais atribuições cuidar das seleções masculina e feminina. Já a primeira divisão, desde 1992, tem uma administração independente e compartilhada entre os 20 clubes participantes.
Apesar de não estar presente no dia a dia da Premier League, a FA é quem trabalha em conjunto com o Ministério do Interior para a liberação de vistos de trabalhos de estrangeiros. Com o Brexit, a entidade percebeu uma oportunidade de reforçar sua seleção nacional e já propôs uma mudança no regulamento da Premier League, para que o número de estrangeiros no elenco de 25 jogadores passe de 17 para apenas 13. O restante das vagas deve ser preenchido por jogadores formados nas categorias de base, independente de sua nacionalidade.
“A federação acredita que aumentar o acesso, mas impedir o aumento do número atual de jogadores estrangeiros, beneficiaria todo o futebol inglês”, defendeu o órgão em comunicado. A preocupação é justificável. Por conta do poderio financeiro e a facilidade de contratar atletas da União Europeia, os clubes ingleses pouco contam com atletas de seu país. As estrelas internacionais trazem dinheiro e prestígio para a competição, mas tiram o poder de força da seleção local em grandes torneios, como a Copa do Mundo.
Como efeito de comparação, o Liverpool, atual campeão da Liga dos Campeões e líder da Premier League, conta apenas com dois ingleses titulares em seu time: o lateral Alexander-Arnold e o volante e capitão Jordan Henderson.
Atual bicampeão inglês, o Manchester City também tem apenas dois ingleses incontestáveis no elenco de Pep Guardiola, o lateral Kyle Walker e o atacante Raheem Sterling.
Na contramão, a Premier League luta para que o número de estrangeiros inscritos em seu campeonato aumente e que as regras para liberação de vistos seja mais branda. “O Brexit não deve ser usado para enfraquecer os times de futebol, nem para prejudicar a capacidade dos clubes de contratar jogadores internacionais”, publicou a entidade em seu site oficial. “Não há evidências de que cotas mais fortes do que as existentes agora tenham um impacto positivo nas seleções”, reforça a nota.
O medo dos times é perder a relevância da liga, a mais popular da atualidade. Hoje, os estádios ingleses têm taxa média de ocupação acima de 95% e é transmitida para 189 países diferentes Apenas em impostos com salários de jogadores e estafes, ingressos e tudo que envolve o futebol, a Premier League gera 3,3 bilhões de libras (cerca de R$ 18 bilhões) em impostos para o Reino Unido.
CONCORRÊNCIA
Hoje, as equipes da Premier League precisam inscrever pelo menos oito atletas que tenham sido formados na Inglaterra, não necessariamente britânicos, em seu elenco de 25 jogadores. As outras 17 vagas são livres.
Com o Brexit, a Premier League também ficaria impossibilitada de contratar jogadores menores de idade de acordo com as regras da Fifa. Atacar o mercado de potenciais estrelas foi algo muito comum para as equipes inglesas nos últimos anos.
Para evitar a concorrência com outros clubes gigantes depois que os atletas já estão formados, os times da Terra da Rainha tinham como estratégia tirar os jovens talentos de suas equipes logo que eles se tornavam profissionais. Foi assim que o Arsenal tirou Cesc Fábregas do Barcelona e o Manchester United tirou Paul Pogba do modesto Le Havre. As negociações aconteceram quando ambos tinham apenas 16 anos.
A saída do Reino Unido da União Europeia também terá um impacto econômico. A expectativa do mercado é de que a libra perca valor de mercado. Este fato também é temido pelos times ingleses, que teriam mais dificuldade para disputar com clubes de outros países a contratação de atletas.
*Com informações do Estadão Conteúdo
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