Apenas 15% das barragens com risco cumprem a lei e têm plano de emergência
A catástrofe causada pelo rompimento das barragens de rejeito de minério em Mariana (MG) expôs a precariedade na fiscalização e nos programas de riscos e danos relacionados a essas estruturas instaladas no Brasil. A falta de monitoramento e de recursos humanos e financeiros para as vistorias tem levado, há cinco anos, ao descumprimento da lei que trata especificamente desse tema, uma situação que já era de conhecimento do governo.
Neste ano, a Agência Nacional de Águas (ANA) traçou um panorama dessas estruturas no País em seu “Relatório de Segurança de Barragens”, documento que reúne dados coletados entre outubro de 2013 e setembro de 2014. Os números mostram que o Brasil tem 14 966 barragens, entre reservatórios usados para abastecimento humano, geração de energia e armazenamento de rejeitos industriais e minerais. De todas elas, apenas 432 passaram por alguma vistoria no ano passado.
O cenário é ainda mais crítico quando se constata que somente 165 barragens de todo o País têm um Plano de Ação de Emergência (15%) – pela lei, no entanto, pelo menos 1.129 são obrigadas a apresentar esse instrumento de prevenção.
As limitações do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), responsável por executar o monitoramento de barragens de rejeitos de mineração, ajudam a compor esse quadro de despreparo. A autarquia tem hoje 12 técnicos treinados para fiscalizar 663 barragens desse tipo em todo o País. Em 2011, o DNPM realizou apenas 52 vistorias nessas estruturas. Nos três anos seguintes, passou para 85, 133 e 151 operações, respectivamente. Entre janeiro e outubro deste ano, os cortes no orçamento do DNPM reduziram as vistorias para apenas 61.
O levantamento aponta ainda que há dificuldades de se conhecer com exatidão a situação das barragens, por causa da falta de informações prestadas por empresas estaduais e empreendedores responsáveis pelas estruturas. Faltam informações básicas no cadastro de segurança das barragens: não há dados sobre a altura nem o tipo de material usado em 80,4% dos casos. O volume armazenado também é desconhecido em 55,4 % dos empreendimentos.
As duas barragens administradas em Mariana pela Samarco, controlada por Vale e BHP, se somam a outras 315 estruturas desse tipo instaladas em Minas Gerais – o equivalente a 48% do total nacional. O levantamento da ANA aponta que todas as barragens de rejeitos foram alvo de classificação de risco e dano potencial. O problema, no entanto, é saber se essas classificações estão tecnicamente corretas.
“Baixo risco”?
Em todo o País, apenas 32 delas são enquadradas como de alto risco, ante outras 96 de médio risco e 535 de risco baixo. As duas barragens da Samarco, segundo o diretor de fiscalização do DNPM, Walter Arcoverde, estavam enquadradas como estruturas de baixo risco. Ele próprio admite falha nos parâmetros. “Não pode ser de baixo risco. Isso acendeu o alerta totalmente. Tem de haver uma estrutura muito mais pesada para enfrentar o problema”.
A última inspeção feita nas barragens da Samarco ocorreu em 2012. Por serem consideradas de baixo risco, afirmou Arcoverde, seriam alvo de nova auditoria neste ano, mas essa inspeção não chegou a acontecer nem havia uma data definida. “Há uma mudança de paradigma de gestão na segurança da barragem. Vamos mudar esse padrão. Tem de ser criado um escritório de segurança de barragem, em Belo Horizonte, no Quadrilátero Ferrífero”, diz.
No escuro
O descaso com a segurança do setor também fica evidente quando se observa a falta de informações técnicas sobre as estruturas em atividade. O levantamento da ANA aponta que 86% das 14.966 barragens do País ainda não foram classificadas quanto ao grau de risco e o dano potencial que podem causar. “Somente 11% das barragens cadastradas têm classificação quanto ao dano potencial associado, mostrando que muito ainda deve ser feito”, informa o relatório da ANA.
Para Alessandra Cardoso, assessora de planejamento, monitoramento e avaliação do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), os subsídios e demais vantagens financeiras que o País oferece às mineradoras não justificam esse quadro. “As empresas têm uma série de isenções, até por explorarem na Amazônia, com descontos de 75% no Imposto de Renda sobre Pessoa Jurídica. Enquanto isso, o Brasil é um dos países que menos pagam aos trabalhadores de mineração e, ao mesmo tempo, um dos que mais registram acidentes”, diz. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo (Por André Borges).
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