Atividade física contribui para a saúde mental de quem sofre com câncer e diabetes; entenda

Além de melhorar a autoestima, exercícios podem ser uma excelente fonte de prazer e de alívio de stress

  • Por Camila Corsini
  • 14/02/2021 10h00 - Atualizado em 14/02/2021 11h08
WERTHER SANTANA/ESTADÃO CONTEÚDO Parque do Ibirapuera É importante lembrar, no entanto, que a prática de atividades físicas sob essas condições deve ser sempre orientada por profissionais

O diagnóstico de doenças crônicas, como o câncer e a diabetes, pode desencadear depressão. O choque com a notícia geralmente desestabiliza a saúde emocional, mas o acolhimento e a forma de encarar a situação são determinantes durante o tratamento. “O diagnóstico dessas doenças interfere na nossa subjetividade e na maneira como entendemos o funcionamento de nosso corpo, a doença e seu tratamento. A convivência com essas doenças nos coloca numa condição de repensar e ressignificar o que imaginamos a respeito da nossa saúde e de um corpo que pode ser considerado ‘saudável’ mesmo com a presença de tais doenças. Não aceitar as modificações que a doença crônica impõe, tentando sustentar ainda a existência daquele corpo imaginado antes do diagnóstico, pode levar a um sofrimento emocional considerável”, explica Priscila Pecoli, psicóloga do programa Correndo pelo Diabetes.

“Quando isso não é acolhido, e adequadamente cuidado, pode acabar levando, sim, a quadros mais complexos como o da depressão. É importante levar em consideração que essas doenças impactam as pessoas emocionalmente e o tempo de aceitação é diferente para cada pessoa. Muito mais do que aderir a um tratamento, é necessário tempo e maturação para se incorporar uma nova condição de vida. Um profissional de saúde mental é mais do que recomendado para ajudá-los nessa nova caminhada”, completa. Porém, um outro aliado nesta luta em prol da saúde mental é a prática de exercícios físicos. Iniciativas como o Correndo pelo Diabetes, projeto social que tem como objetivo estimular a prática regular de atividade física como ferramenta de promoção da saúde e inclusão da pessoa com a doença, são fundamentais nesse processo de aceitação do corpo e autoestima.

Os benefícios da atividade física

Fonte de prazer

De acordo com a psicóloga Priscila Pecoli, além de inúmeros benefícios à saúde e à qualidade de vida, é importante considerar, principalmente diante de tratamentos que sejam intensivos e desgastantes, que a prática de exercícios físicos possa ser uma fonte de prazer para essas pessoas. “Começar com atividades mais leves e que levem em consideração o bem-estar sentido ao completá-las auxilia no engajamento das pessoas nessas atividades. Para que haja maiores chances de sucesso, é importante também considerar que as metas estabelecidas sejam atingíveis e elaboradas de acordo com as possibilidades de cada um. Os exercícios físicos, quando realizados de forma segura e agradável, auxiliam para o sentimento de maior conexão com o próprio corpo, aumentam a disposição física e mental, diminuem as chances de desenvolvimento de depressão e ansiedade, entre outros benefícios.”

Alívio do estresse

O professor de educação física do Correndo pelo Diabetes, Flávio Aguiar, acrescenta que a prática também pode ajudar no alívio do estresse em um momento que os pacientes estão sob uma pressão constante. “Quando estamos sob estresse momentâneo não há problemas, mas quando esse estado se alonga, todas as engrenagens sofrem, pois ficamos constantemente sob a ação de hormônios feitos para ter curta duração e que nos preparam para o estado de ‘fuga ou luta’ — é o caso do cortisol, adrenalina e noradrenalina. Eles geram aumento da frequência cardíaca, pressão arterial, níveis de glicemia e níveis de ansiedade, entre outros. Todo esse desbalanço altera sensivelmente nossa capacidade de tomar decisões e lidar com as contingências do dia a dia. O exercício tem a capacidade de reduzir a ação estressora do sistema nervoso parassimpático e traz a sensação de bem estar depois de cerca de 30 minutos que permanece após o exercício.”

Autoestima

Um outro ponto constantemente afetado na vida de quem convive com doenças crônicas é a autoestima. Em diversas situações, paciente com câncer e que passam por quimioterapia enfrentam a queda de cabelo e o inchaço. Já no caso de quem tem diabetes tipo 2, muitas vezes a obesidade e outras comorbidades podem atrapalhar o processo de autoaceitação. “A autoestima pode ser melhorada tanto quando a pessoa percebe modificações em si mesma, como redução do processo inflamatório das células adiposas que ajudam no processo de perda de peso, quanto a redução da necessidade das doses de insulina — propiciando uma ‘tomada de rédea’ no controle das glicemias da pessoa com diabetes. Além da redução da frequência cardíaca em repouso e a redução da resistência periférica à insulina típica dos quadros de diabetes tipo 2”, acrescenta o professor Flávio Aguiar.

Cuidados

É importante lembrar, no entanto, que a prática de atividades físicas sob essas condições deve ser sempre orientada por profissionais para que o exercício seja seguro, eficaz e agradável. “No caso de diabetes e do câncer é importante que sejam realizados tendo o acompanhamento de um profissional de educação física especializado que conheça a dinâmica desses tratamentos para evitar que, no caso de diabetes, episódios de hiper e hipoglicemia surjam em decorrência de tal prática”, explica a psicologa Priscila Pecoli. “E é importante sempre ressaltar que biologia não é matemática e, quando falamos de corpos vivos, significa que diferentes pessoas sempre vão responder de forma diferente a um mesmo estímulo. Nós mesmos podemos responder de forma diferente a um mesmo estímulo, basta mudar elementos simples: horário diferente, noite mal dormida, alimentos de origem ou características diversas”, completa Fábio Aguiar.

“A falta de acompanhamento médico dificulta muito ao paciente elencar todas as mudanças em seu corpo e sua resposta a cada sessão de exercício. Isso pode significar hiperglicemias ou hipoglicemias constantes no exercício e o que sabemos pelas pesquisas é que, quanto maior a variabilidade glicêmica, maior o risco de desenvolver complicações por um tratamento de grandes oscilações. O melhor caminho é a busca das curvas mais suaves e próximas do normal, mas para isso é necessário muito estudo pelos profissionais, testes de glicemia frequentes e exames periódicos a serem avaliados de forma criteriosa. Basear-se em ‘acho que estou bem’ é ignorar o potencial destrutivo silencioso da falta de tratamento. Uma equipe multidisciplinar afinada com os objetivos do paciente reduz o esforço total e encurta os caminhos para os melhores resultados, pois se baseia em aplicação dos conceitos mais atualizados da ciência e os seus ajustes baseados na experiência de quem observa as respostas. Assim, faz os ajustes necessários ao tratamento”, finaliza o professor.

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