Calar um membro do MP é impor mordaça a todos os seus integrantes, diz manifesto
Em tempos de redes sociais frenéticas, em que o presidentes imperialistas trocam ofensas pela internet, o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) julga nesta terça-feira (15) um caso, aberto a pedido do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que pode render uma pena disciplinar de censura pública ao procurador regional da República Carlos Fernando dos Santos Lima – uma das vozes públicas ativas da força-tarefa da Operação Lava Jato, em Curitiba – por emitir opiniões críticas sobre o governo de Michel Temer.
“Calar um membro do Ministério Público é impor uma mordaça a todos os seus integrantes. Silenciar a livre expressão do pensamento seja de quem for impede a evolução das ideias e contribui para sedimentação de vícios. A crítica franca e aberta é motor do progresso. E o progresso, como se diz, é uma locomotiva que não pode ser parada”, registra duro e extenso manifesto assinado por um grupo de mais de 400 procuradores da República e promotores de Justiça, divulgado nesta semana, em defesa da liberdade de expressão e de Carlos Lima.
Decano da Lava Jato em Curitiba, o procurador criticou Temer em um post que fez em seu perfil no Facebook. Na ocasião, Carlos Lima comentou uma publicação que tratava de afirmações do presidente que levantavam suspeita sobre o ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot, envolvendo a delação da JBS, e afirmou que o medebista era “leviano, inconsequente e calunioso” ao “insinuar recebimento de valores por parte do PGR”.
O pedido foi feito por Lula e havia sido arquivado, em dezembro de 2017 por um dos membros da Corregedoria do Ministério Público Mas em março, a Corregedoria Nacional do Ministério Público abriu processo disciplinar e nesta terça o Plenário do CNMP vai decidir se o processo segue. O acusado fará sua defesa.
Lava Jato
Considerado um dos pilares de sustentação da Lava Jato nesses quatro anos, a publicidade dos processos e das investigações sempre foi atacada por investigados. “Devido às suas dimensões transnacionais e à sua evidente complexidade, nos campos social, político e econômico, o caso Lava Jato tem na comunicação social um dos seus mais importantes pilares. É preciso comunicar as ações de procuradores, policiais e auditores, agir de modo transparente, rebater críticas públicas e refutar ataques. Esses sempre virão e é fundamental que haja o contraponto, tão louvável mediante o debate público pela imprensa tradicional e no ciberespaço”, diz o manifesto em defesa de Carlos Lima.
O documento é assinado por Janot, pelo coordenador da Lava Jato de Curitiba, Deltan Dallagnol, e pelos demais membros do grupo. Para eles, “o diálogo de funcionários públicos, inclusive de procuradores e promotores, com a sociedade também nas redes sociais é um ganho civilizatório”.
“Um promotor ou procurador não se despe dessa condição quando vive sua vida privada, nem deixa de ser cidadão quando age nas suas lides públicas. Os membros do Ministério Público não têm meia cidadania.”
O documento registra que “a sombra do autoritarismo, sob vários mantos, ainda se projeta sobre a liberdade de pensamento” e que após a “intensificação das revelações da Lava Jato e, em boa medida, por causa dela, vê-se uma tendência de certos atores da vida nacional de provocar órgãos de controle para restringir a liberdade de expressão de procuradores e promotores de Justiça, mas também de juízes e policiais”.
“Sabem os inimigos dissimulados da República que calar uma voz dissonante é o atalho mais curto para matar a democracia e seus valores.”
Para os membros em defesa de liberdade de expressão e do colega da Lava Jato, “é temerário pretender regular a liberdade de manifestação dos membros do Ministério Público pela via disciplinar punitiva”.
“Este manifesto não é a defesa de um procurador da República, mas da liberdade de expressão de todos os membros do Ministério Público”, diz o texto. Para os signatários, Carlos Lima “corre o risco de ser submetido a pena disciplinar de censura pública, apenas por dizer o que pensa”.
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