MPT quer ações coletivas contra Uber e similares

  • Por Estadão Conteúdo
  • 13/07/2017 08h25
Gabriela Biló/Estadão Conteúdo Segundo os procuradores, Uber e similares não são parte da economia do compartilhamento e precisam arcar com as responsabilidades trabalhistas como qualquer companhia

Após um ano de estudo, procuradores do Ministério Público do Trabalho (MPT) aprovaram um relatório, obtido com exclusividade pelo ‘Estado’, no qual afirmam que a prestação de serviços a aplicativos como Uber, Cabify, 99, Rapiddo e Loggi configura vínculo empregatício de motoristas e motoboys. O MPT planeja usar o documento para embasar ações coletivas contra as empresas na Justiça do Trabalho.

O relatório é fruto do “Grupo de Estudos Uber”, que reúne procuradores interessados no crescente número de ações contra a companhia americana. Apesar de ter sido elaborado antes da reforma trabalhista, o estudo levou em conta ações impetradas contra a empresa, símbolo da chamada “economia do compartilhamento”.

Segundo os procuradores, Uber e similares não são parte da economia do compartilhamento e precisam arcar com as responsabilidades trabalhistas como qualquer companhia. “O que o Uber e outras empresas fazem é controle por aplicativo, criando um grupo de falsos autônomos”, afirma Rodrigo Carelli, procurador do MPT. “É preciso uma mudança, senão a sociedade vai pagar a conta.”

Para chegar a essa conclusão, em pouco mais de um ano, 11 procuradores do MPT examinaram oito ações coletivas contra o Uber em seis países, como Estados Unidos, Espanha e Inglaterra. Além disso, estudaram quatro processos de motoristas brasileiros contra o Uber: em um deles, a Justiça reconheceu o vínculo empregatício, enquanto, nos outros três, a Justiça foi favorável ao Uber. Eles também estudaram uma ação movida por um motoboy contra o aplicativo de entregas Rapiddo, no qual a Justiça deu ganho de causa ao profissional.

Aprovado em junho, o relatório foi distribuído a um amplo grupo de promotores do Ministério Público Federal. A expectativa é que eles entrem com ações coletivas na Justiça contra as empresas. Uber e Rapiddo, que já foram acionados individualmente, podem ser as primeiros a sofrer os processos. “Queremos embasar ações civis coletivas para que haja uma unificação de decisões da Justiça”, afirma Carelli.

Efeito

Caso as ações aconteçam em larga escala, o caso deve prejudicar o crescimento da “economia do compartilhamento” no Brasil, segundo especialistas. Deverá haver também novas discussões em relação à responsabilidade das empresas em outros itens, como danos aos veículos ou custos de combustível. “Isso dificulta a ampliação de economia colaborativa, que possibilita às pessoas o trabalho autônomo”, diz Jorge Boucinhas, professor de direito trabalhista da Escola de Administração de Empresas da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

Em outros países, o Uber tem sofrido as consequências de processos semelhantes. Nos EUA, uma ação coletiva de 2016 exige do Uber um pagamento de US$ 850 milhões. O app ofereceu US$ 100 milhões para fazer um acordo, mas o valor foi negado. Na Suíça, o órgão que administra o seguro social decidiu, em 2016, que os motoristas são empregados do Uber para fins previdenciários. A França também exigiu que o Uber pague multa por falta de reconhecimento de impostos previdenciários – a empresa também recorreu. Hoje, a modalidade UberX, a mais popular do serviço, já não pode mais operar no país.

O relatório do MPT usa os mesmos argumentos. “As novas relações que vêm ocorrendo através das empresas de intermediação por aplicativos, apesar de peculiares, atraem a plena aplicabilidade das normas de proteção ao trabalho subordinado, autorizando o reconhecimento de vínculo empregatício entre os trabalhadores e as empresas intermediadoras”, dizem os procuradores. O Uber e os aplicativos de entregas Rapiddo e Loggi são citados várias vezes no documento, mas, segundo apurou o Estado, Cabify e 99 também estão no alvo do MPT.

Os procuradores lembram que há controle da jornada de trabalho dos profissionais e ilustram o argumento com o exemplo do Uber. “O trabalho dos motoristas é moldado pelo uso de práticas de vigilância pelo empregador”, diz o documento. “O aplicativo estimula motoristas a aceitarem todas as corridas e a permanecerem o maior tempo possível trabalhando.”

Reações. Procuradas, as empresas dizem discordar do entendimento dos procuradores. “Os motoristas são clientes, que pagam taxa para ter acesso ao serviço”, disse a 99, em nota.

O aplicativo de entregas Loggi informou que “já passou por dois procedimentos questionando seu modelo de negócio” e que a “conclusão foi pelo arquivamento, pela inexistência das violações”. A Rapiddo disse que “a relação com fornecedores de serviços está muito distante de uma típica relação de emprego”.

O Cabify afirmou que “não existe qualquer procedimento administrativo conclusivo do MPT em relação à Cabify” e que “os condutores cadastrados não são prepostos da empresa”. Também em nota, o Uber afirmou que já venceu dez processos na Justiça do Trabalho no País e está recorrendo em outros dois. A empresa destacou que não “contrata os motoristas, mas os motoristas que contratam o Uber” quando escolhem usar o aplicativo.

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