Para especialistas, surtos em navios eram ‘tragédia anunciada’; entenda por que cruzeiros são propícios à Covid-19

Associação Brasileira de Navios de Cruzeiros anunciou suspensão das atividades após dezenas de infectados; médicas dizem que vacinação diminuiu possibilidade de casos graves da doença

  • Por Victoria Bechara
  • 09/01/2022 10h00
PAULO CARNEIRO/PHOTOPRESS/ESTADÃO CONTEÚDO - 18/12/2021 Navio de cruzeiro MSC Preziosa ancorado em píer do Rio de Janeiro Temporada de cruzeiros foi cancelada por causa do surto de Covid-19

A Clia (Associação Brasileira de Navios de Cruzeiros) anunciou na última segunda-feira, 3, que as empresas do setor decidiram suspender a temporada de navios após a confirmação de centenas de casos de Covid-19. A entidade afirmou que as atividades serão suspensas pelo menos até 21 de janeiro. A decisão ocorreu após recomendação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que informou que as cinco embarcações que operavam no litoral brasileiro somaram 798 infecções por Covid-19 em apenas nove dias (a maioria dos casos foram leves ou assintomáticos). Flávia Bravo, diretora da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), afirma que um navio é o exemplo de local que se deve evitar durante uma pandemia. “São ambientes fechados, de aglomeração, com pessoas vindas de diversos lugares e que tendem a não seguir as medidas de proteção, como uso de máscaras, lavagem de mãos etc. Cruzeiros são situações propícias não só para a Covid, como para outras doenças. Na realidade, acontecer surtos de Covid-19 em navios é uma pedra cantada, uma tragédia anunciada e previsível”, explica. 

Raquel Stucchi, professora da Unicamp e consultora da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), afirma que a apresentação do teste negativo ou exigência de comprovante de vacinação acaba gerando uma sensação de “falsa segurança” aos passageiros, que relaxam outras medidas de proteção como o uso de máscara, álcool em gel e distanciamento social. Flávia Bravo salienta que somar a testagem e a vacinação aos outros cuidados diminui a transmissão, mas lembra que zerar os riscos é impossível. “A Covid realmente é uma doença em que a gente recebe uma surpresa a cada dia, e o risco de haver uma variante que pode mudar a tendência epidemiológica vai sempre existir enquanto continuar a pandemia, principalmente sabendo que nós temos porções de não vacinados ao redor do mundo. Então, a gente precisa considerar se esse é o melhor momento de arriscar a viagem.” 

A Costa Diadema e a MSC, através da Clia, afirmaram que os protocolos de precaução eram bastante rígidos, mas iniciaram conversas com entes governamentais federais, dos Estados e municípios para “rediscutir o cenário”. A entidade disse que “uma série de contratempos” tornou inviável manter as operações dos cruzeiros. As especialistas ouvidas pela Jovem Pan avaliam que foi acertada a decisão das companhias de suspender as atividades. Elas ressaltam ainda que o fato de a maioria dos casos ter sido assintomático ou leve se deve à vacina.

“No último ano ficou muito claro que as pessoas que têm formas graves da doença, que estão internadas ou que eventualmente vêm a falecer por causa da Covid, são as não vacinadas”, diz Stucchi. “O fato de cruzeiros exigirem o passaporte vacinal explica por que a maior parte dos casos ou a totalidade deles foi leve. Lembrando que nos cruzeiros tem gente com comorbidades, pessoas idosas, obesas, diabéticas… Mas ter a vacinação completa realmente diminui o risco de agravamento da doença”, conclui. “Cancelar os cruzeiros foi uma medida de precaução oportuna”, destaca Flávia Bravo. “Enquanto a gente não conseguir ampliar a vacinação, aqueles não vacinados completarem o esquema vacinal e vacinar as crianças, a gente não vai conseguir reduzir a circulação do vírus.” 

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