Presidente é obrigado a revelar o que sabe sobre desaparecido na ditadura, diz órgão do MPF a Bolsonaro
A Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, órgão do Ministério Público Federal (MPF) afirmou, em nota pública divulgada nesta terça-feira (3), que o presidente Jair Bolsonaro (PSL) é obrigado a revelar qualquer informação que tenha sobre o desaparecimento de Fernando Augusto de Santa Cruz Oliveira, pai do presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz.
“O desaparecimento forçado é um dos crimes internacionais que merece a mais severa sanção, posto que reúne diversas ações ilícitas que se originam com a prisão ou detenção ilegal, perpassam a prática de tortura, falsidade sobre o paradeiro, subtração de provas, obstrução da Justiça e, quase sempre, culmina no homicídio e na ocultação de cadáver. Qualquer autoridade pública, civil ou militar, e especialmente o Presidente da República, é obrigada a revelar quaisquer informações que possua sobre as circunstâncias de um desaparecimento forçado ou o paradeiro da vítima”, diz a publicação.
O documento enfatiza que “o crime de desaparecimento forçado é permanente, ou seja, sua consumação persiste enquanto não se estabelece o paradeiro da vítima”. “Qualquer pessoa que tenha conhecimento de seu destino e intencionalmente não o revela à Justiça pode ser considerada partícipe do delito”, continua, em referência a fala do presidente, que disse que sabe como o pai de Sata Cruz desapareceu, e que contaria a história um dia, se ele quiser saber”, mas se antecipou e disse que “ele não vai querer ouvir a verdade”.
Ainda de acordo com a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, “o desaparecimento forçado por agentes do Estado ou por pessoas ou grupos de pessoas agindo com a autorização, apoio ou aquiescência do Estado, é uma grave violação aos direitos humanos, conforme estabelecem duas convenções internacionais promulgadas e ratificadas pelo Brasil.”
Para o órgão, a declaração de Bolsonaro sobre o desaparecimento de Fernando “reveste-se de enorme gravidade, não só pelo atrito com o decoro ético e moral esperado de todos os cidadãos e das autoridades públicas, mas também por suas implicações jurídicas”. A Procuradoriaressalta que “raras situações provocam tanto sofrimento quanto o desaparecimento de um ente querido”.
“No Brasil, mais de 80 mil famílias se deparam, a cada ano, com a situação de desaparecimento, de distintas origens: problemas sociais, de saúde e desaparecimentos violentos. Todas sofrem, quase sempre silenciosamente, essa dor perene, que não cessa enquanto não se descobre o paradeiro da pessoa querida. “O respeito a esse penar é um sinal de humanidade e dignidade, praticado por distintas civilizações e todas as religiões. O direito a um funeral é, aliás, parte essencial de qualquer cultura humana e sua supressão, um dos mais graves atos de crueldade que se pode impor a uma família”, escreveram, juntos, a procuradora federal dos Direitos do Cidadão, Deborah Duprat, e o procurador-adjunto Marlon Weichert.
O órgão do MPF ressalta que “embora seja grave o desaparecimento de pessoas por parte de organizações criminosas, é incomparavelmente mais sério quando perpetrado pelo Estado, responsável por cumprir a lei e garantir aos acusados proteção à vida e à integridade física, além da sua responsabilidade pela garantia dos direitos fundamentais do cidadão, tais como devido processo legal, presunção de inocência, inafastabilidade da jurisdição, proibição da pena de morte e proibição da tortura”.
*Com Estadão Conteúdo
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