Economia brasileira ‘ignora’ a piora da pandemia e PIB pode crescer até 4,5% em 2021

Isolamento menor, alta de commodities e resiliência das atividades fazem analistas revisarem as previsões para cima; ritmo lento de vacinação ainda é desafio

  • Por Gabriel Bosa
  • 23/05/2021 08h00
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Divulgação/Agência Vale Disparada do preço das commodities no mercado internacional impulsionou revisões do PIB em 2021 em meio ao clima de maior otimismo Disparada do preço das commodities no mercado internacional impulsionou revisões do PIB em 2021 em meio ao clima de maior otimismo

O impacto do recrudescimento da pandemia do novo coronavírus foi menor do que o esperado no início do ano e, agora, analistas do mercado financeiro começam a revisar para cima as projeções da expansão da economia brasileira em 2021. Os temores com a saturação do sistema de saúde, o aumento do número de mortes e a reedição de medidas de isolamento social — que levaram a previsões de recessão no primeiro semestre —, se dissiparam nas últimas semanas depois que uma série de resultados positivos indicaram a resiliência da atividade econômica em meio ao pior momento da crise sanitária. As novas estimativas indicam alta de até 4,5% do Produto Interno Bruto (PIB) neste ano, minimizando parte das perdas geradas pelo tombo histórico de 4,1% em 2020. Os números são mais otimistas do que os do governo federal, que revisou a recuperação da economia para 3,5%. Já as fontes consultadas pelo Banco Central estimam que o PIB vai avançar 3,45%, segundo os dados do Boletim Focus. A vacinação continua sendo o grande desafio do país, que poderia crescer ainda mais caso houvesse maior tração na campanha de imunização.

A queda no isolamento social, a despeito da reedição de medidas para tentar diminuir o quadro de infecções, é apontada como o principal fator para as revisões mais otimistas. Dados do Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-Br), considerado a prévia do PIB, mostraram alta de 2,3% da economia no primeiro trimestre, enquanto o Monitor do PIB, divulgado pela Fundação Getulio Vargas (FGV), revelou avanço de 1,7%. Os números mostram que a economia se manteve aquecida na virada do ano, quando veio com o impulso de 3,2% do PIB no quarto trimestre de 2021. Para Carlos Kawall, diretor da ASA Investments e ex-secretário do Tesouro Nacional, esta soma de fatores deve fazer a economia brasileira encerrar o ano com alta de 4,5%. “É uma história de surpresas positivas. O PIB do quarto trimestre nos surpreendeu e jogou o carrego da economia lá para cima.” O ritmo de crescimento do primeiro trimestre deve se expandir para o período de abril a junho e reforçar a retomada da economia com mais robustez no segundo semestre. “Estamos vendo uma alta de 0,4% no primeiro trimestre e 0,1% no segundo. Já para o terceiro e quarto, projetamos uma alta de 1% cada”, diz Kawall.

O otimismo nas revisões também é impulsionado pela disparada dos preços de commodities no mercado internacional, puxada principalmente pelo minério de ferro e pela soja. Analistas também apontam a “poupança forçada” das famílias em meio as restrições, além da manutenção dos investimentos em setores fundamentais para a economia brasileira, como a construção civil. O novo cenário levou a XP Investimentos a revisar a alta do PIB para 2021 de 3,2% para 4,1%. Rodolfo Margato, economista da instituição, também aponta a capacidade dos setores em se reinventarem após mais de um ano de pandemia. “Algo similar pode ter acontecido com as famílias. A utilização de canais virtuais para rotinas de trabalho e transações comerciais são exemplos nesta direção”, afirma. Com o otimismo mais contido, o Credit Suisse alterou a estimativa para a recuperação neste ano para avanço de 4%, ante 3,6% previsto anteriormente. Segundo a economista-chefe do banco, Solange Srour, a mudança veio depois de os indicadores apontarem que o fim de estímulos do governo, como o auxílio emergencial, não paralisou as atividades da forma que estava previsto inicialmente. “O dados econômicos para abril já reforçam o cenário positivo para a economia, com apenas um leve impacto do aperto das medidas de distanciamento social ao longo do mês”, afirma.

O resultado do PIB do primeiro trimestre será revelado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 1º de junho. Para Kawall, a revisão das expectativas antes da divulgação oficial corrobora a mudança do consenso geral para a economia. “Não é usual fazer isso poucas semanas antes de sair o dado de um trimestre. O fato de isso acontecer é porque já está evidente, salvo enorme erro, que o resultado será bom, e que depois se fazem os reajustes”, afirma. O clima poderia ser ainda melhor caso o país tivesse avançado na vacinação contra a Covid-19. Na análise da XP, “há chances razoáveis de um crescimento ainda mais forte”, mas riscos, como a pandemia, devem ser monitorados. A expectativa da ASA já leva em conta um novo ciclo de restrições com a piora do número de casos nos próximos meses. “A vacinação está muito lenta e as coisas reabrem por causa da pressão dos setores. É um processo que tem a descompressão da ocupação hospitalar, há um relaxamento e depois acontece tudo de novo”, afirma Kawall. 

Para 2022, as análises estão mais contidas e apontam uma alta de aproximadamente 2%. O desempenho vai depender se as estimativas para este ano serão de fato alcançadas, além do clima político que o país se encontrará em um ano de eleição presidencial. Para Alexandre Schwartsman, da Schwartsman & Associados e ex-diretor do Banco Central, o acirramento da disputa deve pesar sobre a economia. “A polarização não ajuda a imaginar que o país tenha a capacidade de resolver os seus problemas, em particular das contas públicas”, afirma. O ano que vem também não deve contar com fatores que impulsionaram 2021, principalmente a recuperação pujante da economia no último trimestre, e também vai ser impactado pela normalização da taxa de juros do Banco Central, o que deve cercear a capacidade de consumo da população. “A economia brasileira seguirá andando para frente, mas em velocidade moderada. O acionamento da ‘quinta marcha’ depende de fatores mais estruturais, com destaque ao andamento da agenda de reformas”, diz o relatório da XP.

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