Inflação mostra que ‘veio para ficar’ e economistas já esperam até 8% em maio

Valorização das commodities, dólar alto e gargalos na indústria pressionam os preços no Brasil; alívio é aguardado apenas no segundo semestre, quando taxa acumulada em 12 meses deve desacelerar

  • Por Gabriel Bosa
  • 11/04/2021 12h00
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Marcelo Camargo/Agência Brasil Homem de camisa vermelha abastece carro Petrobras sinaliza novo reajuste dos preços em meio ao encarecimento do petróleo no mercado internacional

O índice que mede a inflação oficial da economia brasileira voltou a subir em março ao registrar avanço de 0,93%, o aumento mais expressivo para o mês em seis anos. No acumulado de 12 meses, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) avançou 6,1%, acima do teto da meta de 5,25% perseguida pelo Banco Central, com centro de 3,75% e piso de 2,25%. O presidente da autoridade monetária nacional, Roberto Campos Neto, afirmou, horas depois da divulgação dos números, que o aumento é temporário, mas reiterou que está mais persistente do que o previsto. O discurso é semelhante ao do ministro da Economia, Paulo Guedes, que disse em março que a alta é setorial, mas alertou para o ritmo acelerado. Para economistas e analistas do mercado financeiro, no entanto, a alta veio para ficar, e estimativas já apontam a inflação entre 7,5% e 8% nos 12 meses acumulados em maio e junho.

Os combustíveis se tornaram o maior vilão da inflação em 2021 após a disparada do barril de petróleo no mercado internacional com a retomada das economias globais neste primeiro trimestre. A alta lá fora também faz a Petrobras reajustar os preços no mercado doméstico, já que a petroleira adota a política de paridade internacional. As mudanças fizeram o preço da gasolina acumular alta de 22% neste trimestre, enquanto o diesel soma avanço de 18%. A perseverança da desvalorização do real ante o dólar, influenciada principalmente pela fuga de investidores do país com o aumento do risco fiscal, e a falta de insumos para a indústria nacional por causa do desequilíbrio nas linhas de produção completam a tríade de fatores que trouxeram a inflação até aqui, e que devem continuar empurrando o índice para cima.

Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados, afirma que, além dos fatores já conhecidos, o IPCA deve sofrer nos próximos meses a forte influência do encarecimento dos medicamentos após a autorização do governo federal para reajuste de até 10% desde o início deste mês – o dobro do permitido em 2020. A alta de 39% do gás natural a partir de 1º de maio é outra pressão que deve vitaminar a inflação até o fim do primeiro semestre. “Os choques vão se juntando e fazem o impacto inflacionário acelerar”, afirma ele, que espera o IPCA em 7,5% no acumulado de 12 meses entre maio e junho. Segundo o economista, a persistência dessa alta difere dos discursos de autoridades sobre a sazonalidade do aumento. “Já estamos falando de pressão que começou no ano passado, veio para esse ano, e pode ficar em 2022. É um choque de três anos que corre o risco de ser permanente se o Banco Central não fizer nada”, afirma. 

A economista-chefe da Reag Investimentos, Simone Pasianotto, prevê alta ainda maior, de aproximadamente 8% nos 12 meses somados entre maio e junho. Além da alta do petróleo, dólar fortalecido e os gargalos na produção industrial, ela também cita o encarecimento de commodities agrícolas, como soja, carne, arroz e feijão, como fonte de pressão no IPCA. “Este cenário de alta das commodities não é algo relacionado ao clima ou uma crise regional, é uma questão estrutural que eu não enxergo como temporária ou sazonal”, afirma. “É uma situação que vai se alongar por um bom tempo até que a pandemia se acomode globalmente.” Por outro lado, Jean Malta, economista da Valor Investimentos, acredita que o IPCA bata a casa dos 7,5% apenas no último trimestre, ao sentir empuxo do valor acumulado desde o fim do ano passado, quando a inflação iniciou a trajetória de alta. “Entre abril e maio de 2020 a inflação foi negativa, mas a partir de setembro começou a crescer. Esse resultado na série acumulada deve fazer o índice aumentar”, afirma. 

A taxa de juros é a principal ferramenta do Banco Central para controlar a inflação. Em março, o Comitê de Política Monetária (Copom) surpreendeu ao elevar a Selic para 2,75%, o primeiro movimento de alta em quase seis anos. Segundo Campos Neto, o atual ritmo do IPCA permite que o colegiado repita a dose de 0,75 ponto percentual e jogue a taxa de juros para 3,5% ao ano no próximo encontro, em maio. Para os economistas, a mudança na política de juros forçará a inflação para baixo, fazendo com que o índice encerre o ano na casa entre 5% e 5,2%, encostando no teto da meta. “O Banco Central fez a sinalização correta em março”, diz Vale, da MB. Para Simone, da Reag, as autoridades estão atentas ao desenvolvimento da curva inflacionária. “O governo já está preocupado, principalmente após o inicio da mobilização nas redes sociais. A gasolina, por exemplo, já teve duas reduções de preço”, afirma.

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