‘Gilmar Mendes não tem isenção para julgar’, diz procuradora Thaméa Danelon sobre suspeição de Moro
Na opinião da procuradora regional da República, o julgamento não deveria ocorrer; ela também questionou a parcialidade do ministro do STF, que já criticou publicamente o ex-juiz
A procuradora regional da República e ex-integrante da Lava Jato em São Paulo, Thaméa Danelon, afirmou ser contra anulação de todas as condenações do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pela Justiça Federal no Paraná relacionadas às investigações da Operação Lava Jato e também questionou a votação da suspeição do ex-juiz Sergio Moro. A decisão monocrática sobre a anulação dos processos de Lula foi tomada na segunda-feira, 8, pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Edson Fachin. “Eu sou contra, juridicamente falando, essa anulação. No próprio juízo, o ministro não declinou os motivos da mudança de entendimento dele”, justificou Thaméa. A procuradora lembrou que a operação tramita há sete anos e não havia motivos para essa decisão ser tomada agora, sendo que o STF já analisou por diversas vezes a alegação. “Essa alegação de incompetência é feita desde o início da operação e o próprio Supremo entendia que a 13ª Vara Federal de Curitiba era competente sim”. Para explicar seu argumento, ela retoma o caso da Eletronuclear.
Em 2015, o ministro Teori Zavascki concluiu que o inquérito sobre o esquema de corrupção na companhia estatal Eletronuclear devia ser separado do processo da Petrobras. Na prática, a medida tirou das mãos do juiz Sergio Moro as investigações sobre o caso e encaminhou os autos relacionados à estatal do setor elétrico à Justiça Federal no Rio de Janeiro, onde se localiza a sede da empresa. “Em relação a outros processos, que envolviam outras empresas, o Supremo entendeu que deveria ser remetido para outras localidades. O que eu, particularmente, tecnicamente falando, não concordo, porque os crimes foram cometidos pela mesma organização criminosa, então não tinha porque ir para outro juízo, mas esse foi o entendimento da Segunda Turma”, explica. “E, mesmo em relação a esse entendimento, o ministro Edson Fachin era contrário. Ele sempre foi voto vencido. Então não ficou claro o porquê dessa mudança de entendimento e dessa decisão monocrática que causou tanta duplicância jurídica.”
Suspeição de Moro
O ministro Gilmar Mendes incluiu na pauta de julgamento da Segunda Turma da Corte, nesta terça-feira, 9, o julgamento sobre a suspeição do ex-juiz federal Sergio Moro nos casos envolvendo o ex-presidente. A decisão tomada por Fachin na segunda-feira, 8, porém, levantou questionamentos sobre se a suspeição de Moro seria julgada. Na opinião de Thaméa Danelon, o julgamento desse habeas corpus não deveria ocorrer. “Eu penso assim, juridicamente falando, o que originou esse pedido de suspeição foram as conversas que foram obtidas ilegalmente. Então, é um produto de crime. E é do próprio entendimento do nosso sistema processual penal e do Supremo que as provas obtidas por meio ilícito não podem ser utilizadas”, diz a procuradora, que acredita que nenhuma tese jurídica pode ser construída em cima das supostas conversas vazadas pelo The Intercept entre o ex-juiz Moro e Deltan Dallagnol. “Existe um segundo ponto. Não tem porque analisar os recursos referentes a processos que foram anulados. O acessório acompanha o processo principal. Se o principal foi extinto, digamos assim, não teria porque julgar recurso, porque já perdeu o objeto”, justifica.
Ela acredita que o julgamento pode ser incluído na pauta, pois o ministro Gilmar já havia sinalizado que ia pautar a questão. “Mas o outro ponto, que eu acho que é uma questão jurídica também, é que o ministro Gilmar já antecipou o voto dele em relação a isso. Por várias vezes, ele fez várias críticas ao comportamento do ex-juiz Moro, dos meus colegas de Curitiba. Então acho que ele nem teria isenção para julgar”, afirma Thaméa. Se os ministros do STF decidirem pela suspeição, a procuradora defende que seja definido o limite da decisão. “Quando se tem uma decisão dessas, que envolve a maior operação de combate à corrupção da história do Brasil, até mesmo do mundo, o impacto é muito grande. Então espero que os ministros tenham cautela e que delimitem bem o âmbito, o efeito dessa decisão. A própria decisão do ministro Fachin também não ficou clara nesse ponto, porque por um lado ele diz que anula os processos, e nem deveria anular, porque, de acordo com a doutrina de processo penal, ele podia só remeter para Brasília sem anular o processo”, argumentou. “Está tudo muito paradoxal. Nunca se viu uma decisão dessa. Mas a gente tem que aguardar e ver quais os limites dessa decisão”, finaliza a procuradora.
Comentários
Conteúdo para assinantes. Assine JP Premium.