Empresário admite que chegou a Queiroga por Barros mas nega que tenha tido ‘facilitador político’

CEO da Belcher Farmacêutica foi convidado pelo líder do governo para participar de reunião com o ministro da Saúde; empresa ofertou 60 milhões de doses à pasta, mas negócio não foi concluído

  • Por Jovem Pan
  • 24/08/2021 16h27
Foto: Edilson Rodrigues/Agência Senado Homem ajeita máscara durante oitiva Emanuel Catori, CEO da Belcher Farmacêutica depôs nesta terça-feira, 24, na CPI da Covid-19

Em seu depoimento à CPI da Covid-19, o dono da Belcher Farmacêutica, Emanuel Catori, admitiu que participou de uma reunião com o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, a convite do líder do governo na Câmara dos Deputados, Ricardo Barros (PP-PR), mas negou que sua empresa tenha tido um “facilitador político” na relação com o governo do presidente Jair Bolsonaro. A Belcher tem sede em Maringá, no Paraná, reduto eleitoral de Barros, e ofereceu 60 milhões de doses da vacina Convidencia ao Ministério da Saúde. Mesmo amparado por uma decisão do ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), que lhe garantiu o direito de permanecer em silêncio em perguntas que pudessem incriminá-lo, o empresário respondeu à maioria dos questionamentos.

A reunião citada ocorreu no dia 15 de abril deste ano. A princípio, o encontro seria entre Ricardo Barros e Marcelo Queiroga. No entanto, além do CEO da Belcher, participaram da agenda Paulo Diniz, CEO da Lifemed; Elcemar Almeida, representante da Vaxxinity; Luis Carlos Nardi, diretor do Hospital Santa Rita de Maringá; e Júlio Felix, representante do laboratório Hilab. Aos senadores, Emanuel Catori disse que não tratou sobre a venda de vacinas para o Ministério da Saúde porque sua empresa só se tornou representante legal da CanSino no Brasil quatro dias depois, em 19 de abril – o laboratório japonês rompeu com a Belcher em junho, alegando motivos de compliance. “Eu não poderia falar sobre a CanSino, porque eu ainda não estava autorizado a falar sobre a vacina”, disse. Em seu tempo de exposição, porém, o senador Rogério Carvalho (PT-SE), suplente da comissão, afirmou que a CPI tem documentos que comprovam que, em março, Belcher e Cansino apresentaram à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) um plano oficial para a importação de vacinas destinadas ao setor privado.

Para os senadores, o episódio reforça a influência de Ricardo Barros dentro do Ministério da Saúde e é mais um exemplo de que o governo Bolsonaro priorizou a negociação para a compra de vacinas com intermediários. “Essa fotografia [da reunião de 15 de abril] é uma fotografia de corpo inteiro, né? Do estilo, do modus operandi do governo que, enquanto recusava os contatos com a Pfizer, com o Butantan, com a OMS, preferia priorizar a Davati, o Dominguetti, o Ricardo Barros. É por isso que nós chegamos a essa situação no Brasil enquanto os brasileiros morriam e continua a morrer”, disse o relator da CPI, Renan Calheiros (MDB-AL). “A escolha da Belcher não se deu por acaso. Ela foi trabalhada e intermediada por pessoas de dentro do governo. Foi uma atuação política para promover esse casamento entre Ministério da Saúde, Belcher e CanSino”, acrescentou o senador Humberto Costa (PT-PE).

O presidente da comissão, Omar Aziz (PSD-AM), criticou o envolvimento de Barros em tratativas relacionadas à compra de vacinas mesmo após o episódio no qual, segundo o deputado Luis Miranda (DEM-DF), o líder do governo na Câmara foi apontado pelo presidente Jair Bolsonaro como “dono do rolo” feito para garantir a importação da Covaxin – Miranda e seu irmão, Luis Ricardo, se reuniram com o mandatário do país, no dia 20 de março, no Palácio da Alvorada, para denunciar irregularidades no processo envolvendo o imunizante indiano. “Mesmo alertado, Ricardo Barros continua operando dentro do governo como se nada tivesse acontecido. É como dizem lá na minha região: esse aí tem coragem de mamar em onça. Além de ser um tucunarezão, tem coragem de mamar em onça”, ironizou.

Em mais de um momento da sessão, Catori se negou a responder quanto a Cansino receberia pela assinatura do contrato de 60 milhões de doses (R$ 5 bilhões) e que parcela deste montante seria repassada à Belcher. O CEO da farmacêutica brasileira também não explicou com detalhes porque o imunizante, de dose única, custaria 70% a mais do que a vacina da Janssen, também de dose única. O empresário se limitou a dizer que neste preço ofertado ao Ministério da Saúde estavam incluídos os valores da logística de importação e o frete.

Outro ponto bastante explorado na oitiva desta terça-feira, 24, foi o envolvimento de Catori com Carlos Wizard e Luciano Hang, dono da Havan. O dono da Belcher Farmacêutica participou de lives para discutir a aquisição de vacinas para o setor privado, iniciativa apoiada pelos empresários. Aos senadores, o depoente disse sua empresa gostaria de comprar imunizantes para poder doá-los ao Sistema Único de Saúde (SUS), como previa a lei 14.125. A iniciativa privada só poderia aplicar as doses em seus colaboradores depois que todo o grupo prioritário fosse imunizado. Porém, em uma das transmissões ao vivo, da qual Emanuel participou, Hang chama o dispositivo de “jaboticaba brasileira” – a ideia de algumas empresas era comercializar as doses diretamente com clínicas privadas.

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