Entenda o que está por trás da crise interna do PSDB

Governador João Doria defendeu a expulsão de Aécio Neves, que rebateu condenando os ‘arroubos autoritários’ do correligionário; estopim para o embate foi a eleição de Arthur Lira como presidente da Câmara dos Deputados

  • Por André Siqueira
  • 11/02/2021 16h01 - Atualizado em 11/02/2021 16h14
ANTONIO MOLINA/ZIMEL PRESS/ESTADÃO CONTEÚDO Governador de São Paulo usa máscara Doria condenou o 'adesismo' de parte da bancada da Câmara ao governo Bolsonaro

A eleição para a presidência da Câmara dos Deputados e o pedido de expulsão do deputado federal Aécio Neves (PSDB-MG) desencadearam uma crise interna no PSDB. Além do parlamentar mineiro, estão no epicentro do embate os governadores de São Paulo, João Doria, do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, a bancada federal do partido e o presidente nacional da sigla, Bruno Araújo. A Jovem Pan elenca abaixo os motivos da tropa de farpas entre caciques tucanos e explica como este episódio pode influenciar nos planos da legenda para as eleições presidenciais de 2022.

Eleição da Câmara

No dia 1º de fevereiro, Arthur Lira (PP-AL) foi eleito presidente da Câmara dos Deputados. Ele conquistou 302 votos e derrotou Baleia Rossi (MDB-SP), candidato escolhido pelo então comandante da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), para sucedê-lo. O emedebista contava com o apoio de João Doria e do PSDB, que aderiu formalmente ao bloco costurado por Maia. Antes do pleito, porém, uma ala da bancada, liderada pelo deputado Celso Sabino (PSDB-PA), se aproximou do grupo de Lira. Para evitar que o partido seguisse o mesmo caminho do DEM, que optou pela neutralidade na disputa na véspera da disputa, caciques do PSDB, como o governador de São Paulo, entraram em cena para manter a sigla ao lado do candidato do MDB. Apesar da articulação, Arthur Lira se beneficiou da dissidência e conquistou importantes votos na bancada tucana.

No início desta semana, João Doria defendeu a expulsão de Aécio Neves do partido. O governador de São Paulo atribui ao ex-senador a articulação responsável pelos votos entregues pela bancada do PSDB a Arthur Lira, candidato apoiado pelo presidente Jair Bolsonaro, desafeto político do chefe do governo paulista. Nesta quarta-feira, 11, em coletiva no Palácio dos Bandeirantes, Doria afirmou que o PSDB decidiu atuar como partido de oposição ao governo federal. Por isso, caso Aécio não passasse a se opor ao Palácio do Planalto, ele deveria pedir para sair da sigla. “Não faz o menor sentido o PSDB ser condescendente e aderente ao presidente Jair Bolsonaro. Isso já nos custou votos na eleição da Câmara Federal, onde alguns deputados do PSDB, liderados por Aécio Neves, votaram em Arthur Lira, votaram ao lado do governo, a favor de Jair Bolsonaro e contra os princípios de defesa da posição do PSDB na sua maioria. Já que esta liderança foi de Aécio Neves, a partir de agora, tendo em vista que o PSDB define que será oposição ao governo federal, não cabe ao deputado Aécio Neves outra oposição: ou ele se incorpora ao PSDB e passa a fazer oposição ao governo ou pede para se retirar e vá encontrar um partido onde possa exercer seu adesismo e exaltar Jair Bolsonaro e o bolsonarismo”, afirmou.

Em nota, Aécio afirmou que “o destempero do governador se deve, na verdade, à sua fracassada tentativa de se apropriar do partido”. No comunicado, Aécio afirma que a “longa tradição democrática” da legenda “não será sufocada por arroubos autoritários de quem quer que seja”. Para o deputado mineiro, Doria age “por estratégia eleitoral” e que criou “um conflito artificial dentro do PDSB para alimentar na imprensa projetos pessoais cada vez menos críveis”.

Comando nacional do PSDB

Para lideranças ouvidas pela Jovem Pan, as declarações de João Doria fazem parte de seu plano de aumentar seu protagonismo no partido, a fim de se cacifar como candidato do PSDB à Presidência da República em 2022. Na avaliação de um integrante da bancada federal, a movimentação do governador de São Paulo é legítima, mas ele exagerou no tom. “Doria parece se esquecer que a Executiva Nacional já analisou o caso de Aécio. Em 2019, ele se livrou de uma punição. Os planos políticos do governador são legítimos, mas ele não pode querer impor suas vontades”, disse um deputado à reportagem.

Um aliado do deputado Aécio Neves também se queixa da tentativa do governador de “se impor” como presidente nacional do PSDB. Tradicionalmente, o candidato do partido à Presidência da República assume o comando da legenda – foi assim, por exemplo, com Aécio, em 2013, e com Geraldo Alckmin, em 2017. O parlamentar diz que Doria tem todo o direito de pleitear o cargo, mas afirma que defende a recondução de Bruno Araújo. “A gestão de Bruno é equilibrada, o PSDB se consolidou como força de centro, e as eleições municipais de 2020 nos mostram isso. Doria não pode ser impedido de concorrer à presidência do partido, mas é inadmissível que ele queira se impor. Ele precisa conquistar a maioria. Maioria se conquista, não se impõe”, afirma.

O argumento encontra respaldo dos diretórios estaduais e da maioria da bancada na Câmara dos Deputados. Como a Jovem Pan mostrou, na noite desta quarta-feira, 10, 23 dos 33 deputados federais e presidentes de 26 diretórios estaduais do PSDB manifestaram apoio à permanência de Bruno Araújo na presidência do partido. Em uma carta, os representantes dos diretórios afirmam que a pandemia do novo coronavírus impediu as discussões sobre a renovação dos mandatos dos dirigentes. “Diante da diversidade de cenários regionais e locais, sugerimos o estabelecimento de mecanismos, para que, em casos excepcionais, a renovação dos mandatos possa ocorrer nas Unidades em que forem politicamente necessárias e convenientes ao fortalecimento ou a urgente reorganização partidária”, dizem no documento.

Eduardo Leite 

Há, ainda, um terceiro fator que explica a reação de uma ala do partido à movimentação de Doria. Nesta quinta-feira, uma comitiva de 12 deputados desembarcou no Rio Grande do Sul para um encontro com o governador do estado, Eduardo Leite. Publicamente, os parlamentares afirmam que a agenda tem objetivo de conhecer os feitos da administração gaúcha e estreitar a interlocução com a bancada. Reservadamente, porém, admitem que o encontro é uma oportunidade de lançar informalmente o nome do governador como postulante ao Palácio do Planalto – segundo relatos feitos à Jovem Pan, Leite tem dito a interlocutores que não é o momento de discutir candidaturas para a eleição de 2022.

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