Na CPI da Covid-19, representante da Davati afirma que pedido de propina seria para ‘grupo do Blanco’
Aos senadores, Cristiano Carvalho exibiu mensagens nas quais Roberto Dias, ex-diretor de logística do Ministério da Saúde, pede contato para tratar sobre compra de vacinas
Em seu depoimento à CPI da Covid-19, Cristiano Carvalho, representante da Davati Medical Supply no Brasil, confirmou que foi avisado pelo cabo da Polícia Militar de Minas Gerais Luiz Paulo Dominguetti do pedido de vantagem indevida para a compra de 400 milhões de doses da vacina AstraZeneca pelo Ministério da Saúde. O “comissionamento”, termo usado por Carvalho, seria destinado ao “grupo do Blanco”, em alusão ao tenente-coronel Marcelo Blanco, ex-assessor de Roberto Ferreira Dias na pasta. Aos senadores, o depoente disse que “havia dois caminhos” para negociação com o governo federal: um envolvendo Dias, exonerado do cargo após a denúncia de pedido de propina de US$ 1 por dose, e outro, envolvendo o coronel Elcio Franco Filho, número dois da Saúde na gestão do general Eduardo Pazuello.
“Havia dois caminhos no ministério, aparentemente. Um era via Elcio Franco, e outro pelo Roberto Dias. O caminho que ele [Dominghetti] tentou via Roberto Dias aparentemente não prosseguiu por conta de algum pedido que foi feito, lá, segundo chegou para mim no primeiro momento como grupo do Blanco ou do Odilon”, afirmou. No início da sessão, Cristiano Carvalho também exibiu mensagens enviadas a ele por Dias, que ocupou o cargo de diretor de logística no Ministério da Saúde. No dia 3 de fevereiro, às 19h10, o servidor se apresenta. Às 19h40, o aparelho telefônico registra uma ligação perdida. Um minuto depois, Dias escreve: “Aguardo seu contato”. Às 19h53, há outra ligação perdida. “Eu estava absolutamente incrédulo que o Ministério da Saúde estava me procurando”, disse Carvalho. “É o mais absoluto inverso do que ocorreu com a Pfizer”, acrescentou Renan Calheiros (MDB-AL), se referindo ao fato de a farmacêutica ter enviado quase uma centena de correspondências que foram ignorados pelo governo federal. De acordo com Cristiano, foi Dominghetti que, em janeiro deste ano, trouxe a ele a demanda por vacinas. O depoente acrescentou que só deu atenção ao assunto quando passou a receber e-mails e telefonemas de integrantes do Ministério da Saúde.
O líder do governo no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), minimizou o teor das mensagens e se disse “constrangido” com a conversa. “A gente constata a falta de credenciamento, de capacidade técnica, de habilidade técnica para que essa empresa [Davati] pudesse tratar com o governo brasileiro sobre a compra de vacinas. Estou realmente constrangido com os diálogos que estão sendo aqui mostrados.” O presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM), sugeriu ao emedebista a demissão de Elcio Franco, que atua como assessor da Casa Civil e era responsável pelas tratativas para a compra de vacinas. Ele, inclusive, se reuniu com Cristiano Carvalho, Dominguetti, o coronel Helcio Bruno, do Instituto Força Brasil, o coronel Cleverson Boechat Tinoco Ponciano e o reverendo Amilton Gomes de Paula, presidente da Secretaria de Assuntos Humanitários (Senah), no Ministério da Saúde no dia 12 de março.
“Senador Fernando, o senhor poderia me informar por que o Elcio Franco ainda está no Palácio do Planalto? Está fazendo o que lá? Nós também nos sentimos constrangidos. Me desculpe, mas o Elcio franco está dentro do gabinete do presidente, falando pelo governo, mentindo. Não vamos discutir se tinha vacina ou se tinha propina. Estamos discutindo que o secretário-executivo era o único responsável pela tratativa de vacina. Que a Davati não tem uma vacina para vender, já sabemos. Não podemos fazer de conta que nada acontece. O coronel Elcio Franco está no gabinete do presidente. Eu, sinceramente, acho que você, como líder do governo, sugiro, para o bem do país, um cidadão como o coronel Elcio Franco não pode estar na antessala do presidente. Você não pode passar a mão na cabeça de uma pessoa que brincou com a vida das pessoas negociando vacina fantasma, com indício forte de que houve pedido de benefício. Esse mesmo coronel se negou a falar com a Pfizer. O governo não quis comprar vacina da Pfizer a 10 dólares, mas quis comprar da covaxin a 15 dólares”, disse Aziz.
A Davati Medical Supply entrou na mira da CPI da Covid-19 após Luiz Paulo Dominguetti afirmar, em entrevista ao jornal Folha de S. Paulo, que Roberto Ferreira Dias pediu propina de US$ 1 para cada uma das 400 milhões de doses de vacina da AstraZeneca que foram ofertadas ao Ministério da Saúde. Na comissão, Dominguetti declarou, no dia 1º de julho, que o valor ofertado era de US$ 3,50 por dose. O ex-diretor da pasta nega as acusações. Em nota oficial, a farmacêutica negou que tenha intermediários no Brasil e disse que as tratativas foram feitas diretamente com o governo federal.
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