Pré-candidatos usam TikTok como plataforma de campanha e miram o eleitorado jovem

Dos treze postulantes, seis já têm conta no aplicativo; professor de marketing avalia que ironia e linguagem mais leve são boas estratégias para conversar com a nova geração

  • Por Victoria Bechara
  • 29/05/2022 07h00
EFE/EPA/HAYOUNG JEON tiktok TikTok foi o aplicativo mais baixado do mundo neste ano

Mais de 175 milhões de downloads. Esse é o número alcançado pelo TikTok apenas no primeiro trimestre de 2022. O aplicativo se tornou o mais baixado do mundo, segundo relatório do Sensor Tower. Para além das dancinhas e coreografias virais, vídeos de humor e fatos curiosos, a plataforma também passou a ser usado como ferramenta de campanha política. Dos treze pré-candidatos à Presidência da República, seis já têm contas oficiais na plataforma. Gabriel Rossi, professor de marketing da ESPM e sociólogo, avalia que o aplicativo é uma boa alternativa para conversar com os jovens, mas ressalta que a nova geração não enxerga a política da mesma forma que os mais velhos. “O jovem não vê a política institucionalizada, formal. O TikTok pode ser uma ferramenta importante, se utilizada com sabedoria, porém não dá para querer trazer ideologias pré-moldadas, fixas, uma linguagem formalizada, partidária. Precisa falar de causa, questões do cotidiano, ações práticas, dar voz à pessoas que têm representatividade em certos grupos”, afirmou em entrevista à Jovem Pan. 

O presidente Jair Bolsonaro (PL) é quem tem mais seguidores no aplicativo: 1,6 milhão. O perfil do chefe do Executivo publica, majoritariamente, vídeos com feitos e eventos do governo, trechos de declarações a apoiadores ou à imprensa, além de ataques à esquerda. Bolsonaro, inclusive, passou a realizar suas lives semanais também no TikTok. É perceptível a mudança na linguagem utilizada nas redes sociais do presidente. As postagens mais sérias passaram a ser intercaladas com mensagens debochadas e “memes”. No TikTok, um vídeo em que um homem parecido com Bolsonaro dança uma música da cantora Anitta, por exemplo, teve 13,9 milhões de visualizações – um dos mais vistos da conta do chefe do Executivo federal, que busca a reeleição. “Não sou eu”, escreveu o mandatário, acompanhado de um emoji. Antes disso, ele respondeu a própria artista no Twitter. Outra publicação também rompeu a casa do milhão: a gravação do encontro com o presidente da Rússia, Vladimir Putin, teve 5,9 milhões de visualizações.  

Para Gabriel Rossi, a equipe de Bolsonaro acertou no uso da ironia e deboche nas postagens. “Uma das características da geração Z é justamente essa. Essa geração, inclusive, é a única a de fato aceitar a imperfeição, debocham em relação a isso. Eles também são bastante irônicos em relação às questões institucionais, tabus da sociedade, e essa é uma forma interessante de falar com eles”, avalia. O presidente, no entanto, tem o alto índice de rejeição como maior desafio. O sociólogo também afirma que o discurso de Bolsonaro, focado em uma base radical, pode prejudicar a campanha. 

As principais pesquisas de intenção de voto apontam que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) lidera a disputa pelo Palácio do Planalto, inclusive entre o público mais jovem. Com o ex-juiz Sergio Moro (União Brasil) e o ex-governador João Doria (PSDB) fora da jogada, o petista ampliou ainda mais a vantagem sobre Bolsonaro, segundo o Datafolha. Lula é bastante ativo no Instagram e Twitter, mas ainda não tem uma conta oficial no TikTok. Um perfil criado por apoiadores, no entanto, já atingiu a marca de 172,6 mil seguidores. Procurada pela reportagem, a campanha do petista afirmou que a conta não tem relação com o ex-presidente e sua equipe, mas disse que ele deve entrar para o aplicativo em breve. Segundo Rossi, uma boa tática para atrair o eleitorado jovem é a aproximação com influenciadores. Lula tem adotado essa estratégia. No mês passado, o ex-presidente posou ao lado de Deolane Bezerra, esposa de MC Kevin. “O pai tá estourado, esquece!”, dizia a legenda da foto, citando o bordão da influenciadora e advogada. Ex-participantes do reality Big Brother Brasil, da TV Globo, como Gleici Damasceno e Arthur Picoli, também estiveram ao lado do petista no lançamento de sua pré-campanha. “O desafio do Lula agora é furar a própria bolha. Ele tem muitos apoiadores, mas falta alcançar o voto daquele que está indeciso”, afirma Rossi. 

Para o professor de marketing, o pré-candidato que está mais perto do eleitorado jovem hoje é Ciro Gomes (PDT). O lema da campanha do pedetista, inclusive, é “A Rebeldia da Esperança”. “Eu acho que o Ciro peca na execução, mas é o que mais está tentando se aproximar dessa juventude. Ele conseguiu reconhecer que há dois temas importantes entre eles, o acesso à universidade e a inserção no mercado de trabalho, e ele está conseguindo falar disso em uma linguagem mais jovem”, avalia Rossi. Ciro tem 114,5 mil seguidores no TikTok. Além das propostas de governo, o perfil do pedetista também passou a publicar trechos de lives realizadas nas redes, batizadas de “Ciro Games”. Os vídeos do debate com o comediante Gregório Duvivier, por exemplo, chegaram a até 260 mil visualizações no aplicativo. Uma outra postagem em que Ciro rebate Bolsonaro sobre a Petrobras chegou a 1 milhão. 

Mesmo com a movimentação na internet, o cearense não cresceu nas pesquisas presidenciais e segue em terceiro lugar, com cerca de 8% das intenções de voto. Além de Bolsonaro e Ciro, outros pré-candidatos como André Janones (Avante) e Pablo Marçal (PROS) também crescem no TikTok, com 157 mil e 143 mil seguidores, respectivamente. Simone Tebet (MDB) e Luiz Felipe D’Ávila (Novo) estão no aplicativo, mas ainda não tiveram as contas verificadas e têm pouco engajamento. Apesar do conteúdo mais leve, Rossi destaca que a brincadeira nas redes sociais tem hora. “O TikTok tem uma outra leitura que os candidatos estão errando. Não é só a diversão, as piadinhas. Do jeito dele, o jovem fala também de coisas muito sérias na plataforma – usando às vezes uma linguagem lúdica, o deboche, a brincadeira – mas fala de tudo”, conclui. 

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