Sócio da VTCLog nega pagamentos a Roberto Dias, mas não explica contratos com Ministério da Saúde
Senadores da CPI da Covid-19 apontaram irregularidades nos acordos e na prática da empresa, e Raimundo Nonato Brasil atribuiu valores à ‘alta demanda’ da pandemia
Em depoimento à CPI da Covid-19, o sócio da VTCLog, Raimundo Nonato Brasil, negou pagamentos ao ex-diretor de Logística do Ministério da Saúde Roberto Ferreira Dias, mas não soube explicar os contratos vigentes firmados entre a empresa e a pasta do governo federal. Em mais de um momento, quando questionado sobre detalhes dos acordos, o depoente afirmou que o assunto era “complexo” e precisou recorrer a documentos apresentados a ele pelos advogados que o acompanhavam – uma das pessoas responsáveis por assisti-lo era a diretora-executiva da companhia, Andreia Lima. Ele também afirmou que tinha dificuldades para responder aos questionamentos por ser um homem “simples” e “humilde”. “Nos causa espécie que o senhor Raimundo Nonato não consiga responder à maioria dos questionamentos. Infelizmente, temos que ouvir os advogados respondendo por ele, sendo que ele foi o depoente designado”, disse a senadora Soraya Thronicke (PSL-MS), representante da bancada feminina.
No final do mês de agosto, quando a comissão recebeu Ivanildo Gonçalves, funcionário da VTCLog, os senadores exibiram imagens que mostram o motoboy pagando boletos de Dias, exonerado do cargo depois de ter sido acusado de pedir propina para a compra de vacinas. O ex-diretor do Ministério da Saúde autorizou um aditivo de 1.800% no contrato da empresa com a pasta. Titular do colegiado, o senador Humberto Costa (PT-PE) ressaltou que o valor do reajuste indicado pela área técnica do órgão seria de R$ 1 milhão, mas a companhia defendia R$ 57 milhões. “Esses R$ 18 milhões eram um meio-termo entre o que queria o jurídico do ministério, que era 1 milhão, e a conta pela cláusula que o contrato tinha anteriormente, então ficou em 18 milhões depois que o doutor Roberto Dias propôs esse meio termo”, disse o petista. O acréscimo foi suspenso por decisão do ministro Benjamin Zymler, do Tribunal de Contas da União (TCU) – o magistrado apontou a possibilidade de que o acordo celebrado tenha configurado uma tentativa de fraude aos cofres públicos.
No início da sessão, o relator da CPI, Renan Calheiros (MDB-AL), afirmou que a comissão tem “comprovações de que VTCLog pagou compromissos do senhor Roberto Dias. Estou perguntando se houve pagamentos para convencê-lo a assinar o aditivo”. “Nunca houve pagamento ao senhor Roberto Dias. Dou minha palavra de homem”, respondeu Raimundo Nonato. O depoente, porém, não soube explicar o motivo do pagamento dos boletos em favor de Roberto Ferreira Dias, mas, segundo a diretora-executiva da empresa, o ex-diretor de Logística do Ministério da Saúde havia feito o pagamento de um boleto da VoeTur (do mesmo grupo da VTCLog) em dinheiro vivo. De acordo com essa justificativa, o motoboy Ivanildo teria utilizado os recursos de Dias – e não os da empresa – para efetuar o pagamento na agência bancária. Os senadores reagiram à versão apresentada pelos depoentes.
“É muito difícil acreditar nessa história. Eu não posso aceitar a ideia de que a empresa que, salvos alguns problemas, está fazendo bem a logística da entrega de vacinas e insumos, não tenha uma governança e ache necessário ficar mandando o senhor Ivanildo ir ao banco para sacar dinheiro e pagar as contas dos sócios, pagar ração das fazendas dos sócios. Não há como caber na cabeça de ninguém uma ideia como essa. O que vem na nossa cabeça? Esse era um dinheiro para, de alguma forma, beneficiar políticos ou funcionários que tenham ajudado a VTCLog”, disse Humberto Costa. “A senhora [Andreia Lima] fala de ausência de relação com Roberto Dias, mas o conjunto da história é muito difícil de explicar. No dia 23 de março de 2021, a consultoria jurídica do Ministério da Saúde pediu uma série de retificações no segundo termo aditivo do contrato da VTCLog com o ministério, o que foi ignorado pelo Roberto Dias, que assinou uma nota técnica sozinho e ignorou todas as recomendações do setor jurídico”, acrescentou Randolfe Rodrigues (Rede-AP), vice-presidente da CPI.
O senador Renan Calheiros também apontou que o Ministério da Saúde firmou oito contratos sem licitação com a VTCLog, em acordos que se aproximam dos R$ 400 milhões e foram firmados entre 2016 e 2018, período no qual a pasta era comandada pelo deputado federal Ricardo Barros (PP-PR), atual líder do governo Bolsonaro na Câmara dos Deputados. “São mais de 330 milhoes sem licitação? Em dois anos?”, questionou o presidente da CPI, senador Omar Aziz (PSD-AM). “Tudo isso em um período sem pandemia, quando as pessoas poderia dizer ‘olha, estamos em um momento excepcional’. Não me recordo de um momento de excepcionalidade em 2018”, seguiu Aziz. A comissão aprovou um requerimento para que a Saúde justifique por quais motivos a pasta não realizou os processos licitatórios. “Nosso contrato com o Ministério da Saúde é sobre demanda. Se tiver demanda, [a empresa] fatura. Se não tiver demanda, não fatura. Todo serviço prestado é sobre demanda”, respondeu Raimundo Nonato.
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