Bolsonaro facilita ainda mais compra de armas e população se mune de maneira assustadora
Presidente alterou quatro decretos federais, favorecendo o acesso a armas de fogo no país, sem burocratização; partidos de oposição, institutos e políticos se colocaram contra a medida, e ameaçaram ir ao Supremo Tribunal Federal
Nesta terça-feira, 16, dia em que se encerra o Carnaval do Brasil, eu vou me vestir de Durango Kid e desfilarei na Avenida Paulista com um cavalo emprestado por um amigo. A ideia me surgiu com os novos decretos do presidente Bolsonaro que flexibilizam ainda mais a compra de armas de fogo. Logo logo os ambulantes vão vender armas nas esquinas da cidade, a qualquer preço. Já era fácil ter uma arma, agora ficará mais fácil ainda, de forma que esses decretos me inspiraram a participar do último dia do Carnaval da Pandemia em grande estilo. Não pretendo atirar nem assaltar ninguém. Mas já aviso que vou com as seis armas que agora tenho direito. O personagem das histórias em quadrinhos e do cinema viveu no faroeste de 1940. Vestia-se de negro e cobria o rosto com uma máscara da mesma cor. Merece ser lembrado no Carnaval brasileiro, especialmente agora.
Então fica assim: quem já tinha quatro revólveres, pode comprar mais dois. O presidente Jair Bolsonaro alterou quatro decretos federais, facilitando maior acesso a armas de fogo no Brasil, sem burocratização. Um dos decretos presidenciais esclarece que pessoas com direito a porte de armas podem adquirir até seis revólveres de uso restrito. Até agora o limite era quatro. Isso incluiu Forças Armadas, policiais e membros da magistratura e do Ministério Público. Outro decreto permite que os atiradores podem adquirir até 60 armas, e caçadores, 30. As novas medidas elevam também o limite de munição. Nessas categorias, as munições passaram a ser de 2 mil para armas restritas e 5 mil para armas de uso permitido. É uma maravilha. Aos poucos, a população vai sendo armada de uma maneira assustadora. Afinal, o que significa isso, armar as pessoas até os dentes? O Palácio do Planalto afirma que esse aumento de munição vai favorecer o Campeonato Brasileiro de Atiradores, realizado em dez etapas no ano. E os proprietários terão o direito de transportar suas armas pelo itinerário que quiserem. Resumindo, a facilidade para adquirir armas de fogo e munição aumentou de maneira significativa, para felicidade geral da nação. No sábado, 13, Bolsonaro usou as redes sociais para divulgar as medidas defendendo o direito das pessoas se armarem. Lembrou o plebiscito de 2005, quando o povo decidiu pelo direito às armas e pela legítima defesa. Imediatamente, o Instituto Sou da Paz criticou duramente as medidas, observando que esses decretos de Bolsonaro vão piorar ainda mais a violência que reina no país.
Naquela famosa reunião de 22 de abril de 2020, entre palavrões, gritos e xingamentos, Bolsonaro chegou a dizer que quer todo o povo armado, porque o povo armado jamais será escravizado. Nunca se soube ao certo porque Bolsonaro fez essa declaração até porque, mesmo sendo uma reunião tensa, esse assunto não cabia. Neste domingo, 14, o presidente não cabia em si. E dizia que o povo está vibrando com as medidas que tomou. Minutos depois de publicar os decretos no Diário Oficial da União, em pleno Carnaval da Pandemia, o Instituto Igarapé divulgou uma nota criticando a flexibilização das normas para porte e posse de armas no Brasil. Bolsonaro não gostou do que leu e bloqueou o tuíter da cientista política e especialista em segurança pública Ilona Szabó, que atua como diretora-executiva do instituto que estuda questões de segurança e desenvolvimento. Illona escreveu que Bolsonaro foi rápido no gatilho, ao ser bloqueada um minuto depois de publicar sua nota no tuíter, dizendo ser igual ao que ocorre na Venezuela. Já o vice-presidente da Câmara dos Deputados, Marcelo Ramos (PL), aliado de Bolsonaro, mostrou-se indignado com os decretos do presidente, ameaçando até entrar com ação no STF. O parlamentar deu um recado ao presidente, dizendo que as pessoas precisam de vacinas contra a Covid, não de armas, observando que Bolsonaro foi além de sua competência, e que o assunto devia ser encaminhado como projeto de lei à Câmara Federal. Até o chamado Centrão, ao qual Bolsonaro se juntou, está bastante dividido em relação às armas facilitadas à população.
Será o primeiro teste para Bolsonaro com sua base aliada. Parlamentares da oposição criticam duramente as medidas do presidente flexibilizando ainda mais o porte e a posse de armas de fogo no país. O PSOL informou neste domingo, 14, que vai contestar os decretos tanto na Câmara quanto no STF, afirmando que Bolsonaro não pode tratar desses assuntos via decreto. Já o presidente repete que o povo está vibrando com as medidas. Na verdade, o que se vê é uma população sendo armada e não se sabe ao certo qual é objetivo dessa iniciativa. O faroeste brasileiro é mesmo difícil de explicar. Pelos decretos assinados, uma pessoa pode andar tranquilo pelas ruas até com duas armas na cintura. É o Brasil em busca de seu grande destino. Para concluir, recorro a Raul Seixas com o seu “Cawboi fora da lei”, em que ele diz: “Eu não sou besta para tirar onda de herói/ sou vacinado, eu sou cawboi/ cawboi fora da lei/ Durango Kid só existe no gibi/ e quem quiser que fique aqui/ entrar para a história é com vocês.”
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