Misoginia como crime de racismo: projeto tem boa intenção, mas precisa de ajustes
Proposta da senadora Ana Paula Lobato (PDT-MA) foi aprovada ontem pela CCJ (Comissão de Cidadania e Justiça)
O Senado Federal aprovou nesta quarta-feira (22), um projeto de lei que inclui a misoginia (o ódio, desprezo ou aversão às mulheres) entre os crimes de discriminação previstos na Lei do Racismo (Lei nº 7.716/1989). A proposta, de autoria da senadora Ana Paula Lobato (PDT-MA), equipara o preconceito de gênero ao de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. Na prática, se o texto for aprovado pela Câmara e sancionado, manifestações misóginas poderão ser punidas com as mesmas penas previstas para o racismo, que é crime inafiançável e imprescritível.
É inegável que o Brasil ainda carrega raízes profundas de desigualdade de gênero. A cada hora, uma mulher é vítima de violência sexual; a cada sete horas, uma é assassinada e, em muitos desses casos, o que está por trás é justamente a crença na superioridade masculina. Tipificar a misoginia como crime de discriminação coletiva é mostrar que a nossa sociedade não pode mais tolerar mais esse tipo de comportamento.
A decisão do Senado também criminalizada o discurso de ódio contra mulheres, que muitas vezes se apresenta, por exemplo, nas redes sociais, como “opinião”. Um disfarce muito usado pelos agressores, que dizem viver num país “sem liberdade de expressão”. Liberdade para cometer crimes e não serem punidos, neste caso.
Apesar do avanço simbólico, especialistas em direito penal levantam pontos críticos. Ao incluir “misoginia” no mesmo artigo da Lei do Racismo, o projeto não define com precisão o que configura esse crime — o que pode gerar interpretações diversas e espaço para decisões questionáveis. Além disso, o texto não diferencia discurso de ódio (voltado ao grupo) ao crime de injúria pessoal (ofensa a uma mulher específica). Sem ajustes, a misoginia pode acabar não tendo a devida importância nos tribunais, também compostos por juízes em maioria homens (59,53%, dado do CNJ/2025).
A criminalização é importante, mas não resolve, nem de longe, o problema. A misoginia precisa ser combatida com educação, políticas públicas e representatividade. Os debates sobre equidade de gênero e respeito às mulheres, precisam estar nas escolas, nas casas, empresas, na internet e, sobretudo, nas relações cotidianas. Pais e mães que estejam comprometidos em criar meninos conscientes e gentis são capazes de prevenir mais crimes deste tipo do que qualquer lei, escrita num frágil papel e julgada por uma mentalidade ainda revestida de preconceito.
*Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião da Jovem Pan.


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