Em apenas dois dias, Lula mostra que sua ‘bravura’ não passava de ‘bravata’

Que líder é esse que fala sem pensar e depois é obrigado a fazer contorcionismos linguísticos para tentar explicar o que não tem como ser explicado?!

  • Por Reinaldo Polito
  • 14/09/2023 09h00
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Reprodução/Governo Federal Lula Antes os discursos de Lula eram proferidos e não sofriam grandes críticas ou questionamentos. Hoje não

Lula sempre teve fama de ser bom orador. Mesmo que cometesse erros gramaticais e não fizesse discursos muito coerentes, conseguia, como poucos, segurar uma plateia atenta à sua mensagem por tempo bastante prolongado. Jamais entrava no jogo apenas para cumprir tabela. Ia para a frente do público com a faca nos dentes. Ainda que o tema fosse irrelevante, seu desempenho oratório transformava o assunto em matéria preciosa. Era impossível um ouvinte ficar indiferente diante da sua comunicação energizada e eloquente. A forma escamoteava as possíveis inconsistências do conteúdo. Foi assim que ao longo de sua vida arregimentou uma multidão de adeptos. Pessoas que o aplaudiam independentemente do que viesse a dizer. Era visto, e ainda é por muitos, como espécie de divindade.

Por essa e outras razões, o presidente se sente muito à vontade diante do microfone. Sabe que bastará abrir a boca para empolgar os crentes de plantão. Não será difícil deduzir que se, após suas arengas intermináveis, perguntarmos a quem ficou ali extasiado com suas palavras qual foi a mensagem transmitida, provavelmente quase ninguém será capaz de repetir uma só frase. É dessa maneira que se comportam as plateias diante desses encantadores de serpentes. No prefácio que fez para o meu livro “Seja um ótimo orador”, João Mellão Neto conta um fato pitoresco: “Jânio Quadros foi um dos mais geniais oradores que o Brasil já teve. Assistindo a um discurso dele em uma cidade do interior, vi como magnetizou a plateia por uns 40 minutos. Quando encerrou, foi delirantemente aplaudido pelo povo humilde que o ouvia. Na saída, ouço um cidadão comentar com outro: ‘Olha, não entendi nada, mas como esse homem fala bem'”.

Outra cena curiosa, dentro dessa mesma linha, pode ser vista no filme “O discurso do rei”. Em determinada cena, a família real reunida assistindo a um discurso de Hitler. Uma das meninas pergunta ao pai quem era aquele homem. E ouve como resposta: não sei, mas ele fala muito bem. Lula segue essa tradição. Pegou o jeito de dizer o que as pessoas gostam de ouvir e de interpretar uma personagem que provoca entusiasmo nos palanques. Só que falar para convertidos é uma coisa. Discursar, entretanto, para quem está fora da bolha e analisa não só a estética, mas também, e principalmente, o conteúdo não é tarefa nada simples.

Antes os discursos de Lula eram proferidos e não sofriam grandes críticas ou questionamentos. Hoje não. Até antes mesmo de concluir suas perorações as mídias sociais já trombeteiam os possíveis deslizes que tenha cometido. Quando as escorregadelas ocorrem fora do país, então, a repercussão é ainda maior. Por isso, sabemos tão rapidamente das gafes sucessivas que o presidente tem cometido por onde viaja. Em vista desses atropelos verbais, temos a impressão de que Lula perdeu um pouco de seu encanto diante do microfone. Além da queda na qualidade da comunicação, seus improvisos têm sido tão ruins que precisou, ao que tudo indica, até contrariado, ler algumas de suas mensagens. 

A solução seria perfeita se ele pudesse ser monitorado 24 horas por dia. Não pode. Às vezes se torna impossível redigir o que ele vai dizer. Aí é que o presidente acaba por meter os pés pelas mãos. E parece que fora do país a situação se torna ainda mais incontrolável. Já deu para perder a conta dos deslizes verbais que comete em seus pronunciamentos no exterior. São dois fatores que o levam a colecionar tantos equívocos em seus discursos: o primeiro é a sua evidente falta de preparo para abordar temas de tamanha complexidade. São questões que exigem profundo conhecimento histórico e cultural de quem os avalia. O segundo é fruto de negligência. Com tantas pessoas competentes ao seu lado, não custaria nada pedir orientação para se inteirar dos fatos relacionados à cada situação.

Na tentativa de se projetar internacionalmente, em cada pronunciamento rasura a própria imagem. Foi assim quando se referiu à guerra entre Rússia e Ucrânia, afirmando que os ucranianos têm tanta responsabilidade quanto os russos nesse conflito. Ainda bem que ficou intramuros sua tese de acabar com os combates entre as duas nações tomando uma, duas, três cervejas, ou até uma caixa dessa bebida. Há pouco tempo, em sua passagem pela Costa do Marfim, voltou a dizer impropriedades. Revelou em alto e bom tom, para quem quisesse ouvir, que sentia “profunda gratidão ao continente africano por tudo o que foi produzido durante 350 anos de escravidão” em nosso país.

Sem contar que nem precisou do AeroLula para tratar o ditador Nicolás Maduro como um democrata. Fez essa declaração aqui mesmo em terras tupiniquins. Como, entretanto, vários chefes de Estado estavam no Brasil naquela oportunidade, o resultado inconveniente se deu como se suas palavras fossem ditas fora de nossas fronteiras. É só Lula decolar que já vem a dúvida: o que será que o presidente vai aprontar desta vez? É matemático. Se alguém apostasse, poderia esperar o prêmio. Não deu outra. Durante entrevista que concedeu a um canal da Índia, Firstpost, veiculada no dia 9, sábado, disse que se o presidente da Rússia, Vladimir Putin, viesse ao Brasil para a reunião da Cúpula do G20, prevista para novembro de 2024,  não seria preso. 

Quem ouviu essas palavras de Lula deve ter pensado: “esse cabra é macho. Que demonstração de bravura”. Bastou um pouco de reflexão, todavia, para que se dessem conta de que o Tribunal Penal Internacional expediu mandados de prisão contra o primeiro mandatário russo por crimes de guerra. Ora, o Brasil é um dos signatários do acordo, que prevê a obediência aos mandados dessa instituição. Por esse motivo, a “bravura” de Lula passou a ser vista como simples “bravata”. Tanto assim que o presidente, mais uma vez precisou modificar o tom do próprio discurso. Em nova declaração, o petista disse que a decisão caberá à justiça: “Isso quem decide é a justiça. Não é o governo nem o parlamento. É a justiça que vai decidir”. Afinal, que líder é esse que fala sem pensar e depois é obrigado a fazer contorcionismos linguísticos para tentar explicar o que não tem como ser explicado?! Errar uma vez, tudo bem. Duas, vá lá. Cometer essa quantidade de equívocos em tão pouco tempo, porém, não tem razão de ser. Mas quem é que segura o homem?! Siga pelo Instagram: @polito

*Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião da Jovem Pan.

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