‘Coloca o Ministério Público no corredor da morte’, diz Dallagnol sobre PEC que altera conselho
Câmara deve votar proposta ainda nesta quinta-feira; procurador defende que o projeto irá criar uma ingerência política do Congresso sobre as decisões do órgão
O ex-coordenador da Força-Tarefa da Operação Lava Jato, Deltan Dallagnol, avalia que a PEC que amplia o poder do Congresso sobre o Conselho Nacional do Ministério Público é um retrocesso que pode por fim ao órgão. De acordo com o texto, o CNMP passará de 14 para 15 membros, dos quais 4 serão indicados ou eleitos pelo Legislativo. Em entrevista ao Jornal da Manhã nesta quinta-feira, 14, o procurador defende que a proposta irá criar uma ingerência política do Congresso sobre as decisões do Ministério Público. A votação do texto aconteceria na quarta-feira, 13, mas foi adiada para esta quinta após o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), não conseguir costurar acordos para a aprovação da PEC. “É um grande retrocesso. Alguns colegas chegam a dizer que isso coloca o Ministério Público no corredor da morte, que é o fim do Ministério Público. Pelo menos é o fim do órgão como a gente conheceu na Constituição de 1988. Aquele Ministério Público forte, independente, que atua contra a corrupção política, que incomoda pessoas, independentemente do seu poder econômico ou político”, argumentou o ex-coordenador da Lava Jato.
“Essa PEC abre um espaço tremendo para ingerência politica, para que os políticos investigados retaliem os investigadores. Além disso, como se não fosse suficiente o retrocesso que ela promove, ainda abre espaço para que exista uma ingerência polícia do Congresso na revisão dos atos dos procuradores. Ou seja, se não gostaram de uma denúncia, de uma acusação oferecida contra políticos poderosos, eles poderem derrubar as denúncias e pedidos de prisão preventiva”, aponta. Para Dallagnol, a PEC é, sim, uma forma de retaliação à Lava Jato. “Essa PEC não busca corrigir. A Operação Lava Jato pode sofrer críticas. Toda ação inovadora, grande, pode sofrer críticas e aperfeiçoamentos, mas tudo que tem sido feito é para destruir o sistema”, afirma o procurador, que cita como exemplo as mudanças na Lei de Improbidade Administrativa.
“A minha percepção é de que os instrumentos não estão sendo aperfeiçoados. O que foi feito para coibir aquilo que é de fato criticado na Lava Jato? Nada. O que está sendo feito é para efetivamente derrubar investigações e processos”, acrescentou. “Isso pra mim é esdrúxulo, foge daquele que é adequado. Além disso, o corregedor do CNMP, que é a pessoa que tem amplos poderes para investigar outros membros do Ministério Público, vai passar a ser alguém indicado pelo Congresso. Imagina isso dentro da Lava Jato?”, questionou. “Eu não tenho como entender essa PEC fora de um contexto em que existia uma Lava Jato e que não se quer que uma operação semelhante ocorra novamente”.
Dallagnol ainda aproveitou a entrevista para defender o modelo atual do Conselho Nacional do Ministério Público. “É preciso existir um controle, mas ele já existe. Um estudo recente comparou o Conselho Nacional do Ministério Público e o Conselho Nacional de Justiça. No período entre 2005 a 2019, o CNMP instaurou 18 processos administrativos disciplinar (PAD) para cada 1.000 membros, enquanto o CNJ instalou 7,74. O índice do MP é 137% maior do que o do Conselho Nacional de Justiça. CNMP aplicou 10 procedimentos disciplinares por 1.000 membros frente a quatro do CNJ”, citou o procurador. “Punições e fortes atuações do CNMP existem. Talvez os casos não sejam de grande repercussão pública. Mas existe, sim, uma atuação, uma revisão e um código de conduta. O que tá sendo proposto é que o código de confuta venha do Congresso. Mas qual é a profissão que tem uma regulamentação que vem de fora?”, contestou Dallagnol.
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