Procon questiona Ford sobre direitos dos consumidores após anúncio de saída do Brasil
Órgão de defesa do consumidor pede explicações para a montadora sobre atendimento aos clientes; Ministério Público Federal também se manifesta
Diferentes órgãos de defesa dos consumidores protocolaram medidas nesta quarta-feira, 13, para questionar a Ford sobre a decisão de encerrar as linhas de produção no país até o fim deste ano. O Procon de São Paulo pediu informações sobre o atendimento aos clientes que possuem veículos dentro do prazo de garantia, e por quanto tempo e de que forma serão disponibilizadas peças de reposição para modelos que estão fora da garantia. O órgão ainda questionou a montadora norte-americana se o encerramento das fábricas no país causará impacto no prazo de entrega dos veículos encomendados recentemente. A montadora deve responder ao requerimento dentro de 48 horas. O fechamento das fábricas da Ford no país também provocou o Ministério Público Federal (MPF) a instaurar procedimento administrativo para acompanhar os impactos socioeconômicos da medida. Por meio da Câmara de Consumidor e Ordem Econômica (3CCR), os promotores irão averiguar se o encerramento das atividades causará prejuízos ao setor industrial do país. Segundo o coordenador da 3CCR, supbrocurador-geral da República Luiz Augusto Santos, a decisão da montadora gerará efeitos “capazes de provocar a redução dos níveis de renda e emprego nacionais, afetando negativamente a economia, além da potencial repercussão no nível concorrencial do mercado de veículos.”
A Ford anunciou nesta segunda-feira, 11, que encerrará todas as linhas de produção no Brasil até o fim deste ano. As plantas de Taubaté (SP) e Camaçari (BA) terão as atividades fechadas imediatamente, enquanto o complexo industrial de Horizonte (CE) continuará operando até o último trimestre de 2021. De acordo com a montadora, serão mantidas no país apenas as operações do Centro de Desenvolvimento de Produto, na Bahia, o Campo de Provas, em Tatuí (SP), e sua sede regional em São Paulo. A saída do Brasil é justificada pela reorganização administrativa da montadora em todo o mundo e ocorre pouco menos de dois anos após o fechamento da fábrica em São Bernardo do Campo, no ABC paulista. Segundo entidades, o encerramento das atividades resultará na perda de ao menos 5 mil empregos. Somente na planta de Camaçari, a mais moderna da montadora no Brasil, a previsão é 10 mil trabalhos afetados de forma direta e indireta. Segundo Lyle Watters, presidente da Ford América do Sul e Grupo de Mercados Internacionais, a montadora entrará em contato com os sindicados para debater as demissões. “Trabalharemos intensamente com os sindicatos, nossos funcionários e outros parceiros para desenvolver medidas que ajudem a enfrentar o difícil impacto desse anúncio. Quero enfatizar que estamos comprometidos com a região para o longo prazo e continuaremos a oferecer aos nossos clientes ampla assistência e cobertura de vendas, serviços e garantia. Isso se tornará evidente ao trazermos para o mercado uma linha empolgante e robusta de SUVs, picapes e veículos comerciais conectados e eletrificados, de dentro e fora da região”, afirmou.
A norte-americana chegou ao Brasil em 1919 e foi a primeira montadora a se instalar no país. O aviso da saída pegou o governo federal de surpresa diante dos incentivos concedidos à montadora ao longo dos ano. O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) criticou a decisão da marca ao afirmar nesta terça, 12, que o encerramento das atividades no país foi pela falta de subsídios. “A empresa não fala que em novembro nós criamos 414 mil empregos. Estamos perdendo 5 mil empregos agora, lamento. Mas o que a Ford quer? Faltou a Ford dizer a verdade. Querem subsídios”, disse o presidente. Em nota, o Ministério da Economia lamentou a decisão e afirmou que a saída da montadora “destoa da forte recuperação observada na maioria dos setores da indústria no país, muitos já registrando resultados superiores ao período pré-crise.” A decisão não gerou tanto espanto nos analistas do setor diante das pressões que as marcas estão sofrendo ao redor do globo nos últimos anos, e que se tornaram ainda mais intensas pela pandemia do novo coronavírus. Além dos desafios mundiais, especialistas apontam o clima hostil do Brasil para a manutenção dos negócios diante da complexidade tributária, a retração do mercado consumidor e a falta de diálogo entre o setor automotivo e o governo federal. A saída da Ford ocorre meses após a decisão da Mercedes encerrar a única planta no país, em dezembro de 2020. Para especialistas, a fuga das montadoras pode se intensificar caso não haja mudanças significativas que incentivem as marcas a apostarem no país.
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