Pressão de aliados por substituição de ministra do Turismo impõe dilema a Lula e divide petistas

Lideranças defendem troca no ministério como ‘pertinente’ e projetam aumento da base aliada; diretório estadual do PT do Rio se opõe à mudança

  • Por Caroline Hardt
  • 12/06/2023 19h03
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FáTIMA MEIRA/FUTURA PRESS/ESTADÃO CONTEÚDO Lula e Daniela Carneiro Ministra do Turismo, Daniela Carneiro enfrenta processo de fritura e pode deixar o comando da pasta

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) enfrenta um dilema envolvendo um dos partidos que compõem seu quadro ministerial: o União Brasil. Com a evidente cisão entre aliados a cerca da manutenção da deputada federal licenciada Daniela Carneiro (União Brasil-RJ) no Ministério do Turismo, o chefe do Executivo vê aumentar a pressão para substituir a escolhida por um nome mais alinhado com a bancada na Câmara dos Deputados. O movimento visa garantir a Lula maior apoio da legenda para as próximas votações de interesse do Planalto na Casa, como a reforma tributária, e consolidar – quase seis meses após o início do governo – uma base sólida. Por outro lado, a escolha de Carneiro para a pasta integra a cota pessoal de indicações do petista para os ministérios. Esposa do prefeito de Belford Roxo, Waguinho (Republicanos-RJ), a ministra e o marido foram importantes cabos eleitorais de Lula na Baixada Fluminense, reduto dominado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) – dentro do PT, há quem diga que a vitória de Lula no segundo turno passe necessariamente pela movimentação do casal. É por isso, inclusive, que o diretório fluminense do Partido dos Trabalhadores rechaça a troca no comando da pasta.

A insatisfação de membros do partido com Daniela Carneiro também não é novidade. Como o site da Jovem Pan mostrou, parlamentares já afirmavam, desde o início do ano, que se sentiam “não representados” pela ministra e ventilavam que a escolha colocaria em risco a consolidação de apoio do partido ao Executivo. A troca no Turismo chegou a ser cogitada antes mesmo dos 100 dias de governo, mas Lula assumiu os riscos e descartou, inicialmente, a substituição, defendendo publicamente Carneiro. “Daniela foi a única deputada da Baixada Fluminense que me apoiou de verdade. Ela e o marido. E pagaram um preço muito caro ao governo anterior”, disse Lula, em março deste ano. A decisão, no entanto, minou o apoio da legenda ao governo federal e trouxe importantes reveses para o Palácio do Planalto. O União Brasil, vale dizer, votou em peso para derrubar o decreto de Lula sobre o Marco do Saneamento na Câmara dos Deputados.

Recentemente, durante votação do Marco Temporal de Demarcação das Terras Indígenas, de 50 deputados, apenas dois seguiram as orientações do governo. Na votação da Medida Provisória 1154/2023, mais conhecida como MP dos Ministérios, o União Brasil decidiu fechar acordo contra a matéria, que definiria a estrutura dos ministérios do governo Lula 3. Membros do partido também chegaram a apresentar um projeto de lei prevendo um projeto de Lei prevendo um novo regime fiscal em alternativa ao arcabouço fiscal, apresentado pelo Executivo. Na semana passada, em pedido de impeachment apresentado por parlamentares da oposição na última sexta-feira, 09, três dos signatários são deputados do partido. Agora, quase seis meses após as primeiras polêmicas envolvendo Carneiro, interlocutores e líderes do Planalto, assim como o próprio presidente, já avaliam a troca no Turismo, em uma nova tentativa de consolidar uma base pró-Lula no Congresso, especialmente na Câmara.

Nesta segunda-feira, 12, o líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), disse considerar “pertinente” a troca da ministra Daniela Carneiro do Ministério do Turismo. Segundo ele, em se confirmando a saída da ministra para o Republicanos, há uma “lógica” em promover a mudança. “Não estou defendendo que ela saia, mas, confirmado o fato que ela pediu para sair do partido, é óbvio que o partido vai dizer que era a nossa representação e não é mais”, disse. O principal cotado para assumir a vaga é o deputado federal Celso Sabino (União Brasil-PA), aliado de primeira hora do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL). O presidente nacional da legenda, Luciano Bivar (União Brasil-PE), também já defendeu publicamente a indicação de Sabino. Nas palavras de Bivar, Sabino goza de “grande prestígio” e é “bem credenciado” para representar o partido na Esplanada. “Nesse sentido, damos apoio a Celso Sabino sim. Agora, quem faz a mudança é o governo, nós não somos o governo”, disse o cacique à Jovem Pan News. Além do Turismo, em troca de apoio, o União Brasil também mira a chefia da Embratur, hoje comandada pelo ex-deputado Marcelo Freixo (PT), e o cargo de Nísia Trindade, no Ministério da Saúde. A legenda também comanda a pasta das Comunicações e da Integração e Desenvolvimento Regional.

Em sentido contrário, alguns aliados de Lula defendem a permanência de Daniela como estratégia de articulação política no reduto bolsonarista. Em comunicado divulgado no domingo, 11, o diretório estadual do PT no Rio de Janeiro afirmou que a ministra é “parceira da construção política” fluminense. “Sua permanência é a consolidação de um Estado do Rio de Janeiro forte e representado na equipe de ministros do presidente Lula. Encaminho esta nota no sentido de solicitarmos ao presidente Lula a permanência da ministra, e do fortalecimento do Ministério do Turismo”, diz o comunicado. O prefeito de Belford Roxo, Waguinho, também defende a permanência da esposa no cargo e diz que a troca no Turismo seria um erro de articulação e entregar “de bandeja” o potencial político à Michelle Bolsonaro (PL). “A ministra Daniela é de um Estado importante, o Rio de Janeiro, território totalmente bolsonarista, onde nós levamos a campanha do presidente Lula em toda a Baixada Fluminense, no interior, no noroeste. Encorajamos muitas pessoas e pagamos um preço muito caro por isso”, afirmou.

Ministérios não compram apoio

Outra ala do União Brasil entende que, independente do escolhido para o Turismo, Lula não terá o “apoio incondicional” do partido. Em conversa com o site da Jovem Pan, o deputado federal Mendonça Filho (União Brasil-PE), reconheceu que a troca de Daniela Carneiro pode ajudar o Planalto a conquistar votos, mas descartou adesão majoritária a ala governista. “Tem uma ala, da qual faço parte, que tem uma posição de independência e oposição. Vou me manter na minha posição, independente de quem seja convidado para ser ministro no atual governo”, disse o parlamentar. Em entrevista ao Jornal da Manhã, da Jovem Pan News, nesta segunda-feira, o deputado federal Danilo Forte (União Brasil-CE) também ponderou que a “cooptação de um membro do partido” não garante “apoio incondicional” ao governo. À reportagem, ele defendeu que o caminho para conquistar maioria passa pela “construção de políticas públicas com diálogo”, não com ministérios. “Esse modelo de governo de cooptação, de trazer para dentro do governo um quadro dos partidos, faliu completamente. Hoje, o Parlamento tem autonomia que foi construída. O parlamento é um poder tão importante quanto o Executivo e o Judiciário. Se não houver um diálogo sobre a governança e a governabilidade fica difícil o governo ter esse retorno sem se explicar o que ele deseja, como deseja e como será a relação com os partidos”, completou.

Do ponto de vista político, o dilema de Lula em atender aos anseios do partido, liberando novos ministérios e efetuando a troca de Daniela Carneiro, e manter a ministra para garantir apoio no Rio de Janeiro, tem custos altos. Pensando em termos práticos, na Câmara, o novo imbróglio com o União Brasil custa, a cada votação, boa parte dos 59 votos que o partido tem e impõe ao Planalto derrotas amargas. Por sua vez, o presidente também já foi avisado que a retirada de Daniela – mulher, evangélica e politicamente influente na Baixada Fluminense – também trará efeitos no Rio de Janeiro negativos. Quadros importantes do PT vão além e afirmam que, se Lula decidir trocar a ministra do Turismo para, em tese, contemplar o entorno de Lira, poderá se tornar refém do apetite insaciável do Centrão por espaços no governo. Assim, caberá ao petista decidir qual briga comprar e quais consequências pretende enfrentar.

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