Mercado financeiro cobra governo eleito a ‘descer do palanque’ por responsabilidade fiscal

Economistas que apoiaram eleição de Lula no segundo turno falam que situação estava condicionada à promessa de boa gestão econômica pelos próximos quatro anos

  • Por Jovem Pan
  • 24/11/2022 09h58 - Atualizado em 24/11/2022 12h34
Reprodução/YouTube/Lula Lula faz pronunciamento após ser eleito presidente da República Posturas iniciais de Lula vêm desagradando o mercado, derrubando a bolsa de valores e aumentando o dólar no Brasil

As falas iniciais do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sobre a economia do Brasil, a nomeação de Guido Mantega para atuar na equipe de transição de governos, sua objeção ao nome de Ilan Goldfajn à presidência do BID e a PEC da Transição, que prevê aprovar R$ 200 bilhões acima do teto de gastos trouxeram reprovação do mercado financeiro na largada do novo governo. O presidente da Associação Nacional das Instituições de Crédito, Financiamento e Investimento (Acrefi), Luiz Eduardo Carvalho, diz que é hora da “descida do palanque da eleição”. “Venha para a nossa realidade. A preocupação social que Lula tem é absolutamente correta, é uma preocupação nacional, temos que fazer o máximo possível para melhorar as condições de vida do provo brasileiro, mas isso tem que ser feito com responsabilidade. E responsabilidade fiscal acima de tudo”, declara. A Acrefi promoveu em São Paulo o debate “O que esperar da economia e a realidade política”. O ex-ministro da Fazenda Pedro Malan evitou entrevistas, mas ressalta que o apoio dos economistas dado a Lula no segundo turno das eleições estava condicionado ao equilíbrio fiscal. “Ficou muito claro lá que decidimos que íamos votar no segundo turno na expectativa de haver uma condução responsável da economia”, disse.

O mercado financeiro considera que o tamanho do rombo no teto dos gastos deverá determinar a estabilidade ou não da economia brasileira nos próximos anos. Há também uma grande expectativa pelos nomes que vão gerir justamente os ministérios, para saber se haverá, de fato, a possibilidade de atender as demandas sociais sem deixar de lado a responsabilidade fiscal. O economista, pesquisador do Insper e consultor legislativo do Senado Federal Marcos Mendes reforça a ameaça da instabilidade econômica, caso não haja redução significativa no valor pedido pela PEC de Transição. “Uma trajetória de perda de estabilidade, e isso é muito sério, porque isso faz os juros dispararem, faz as expectativas de crescimento econômico desabarem. Foi basicamente isso que aconteceu quando a gente teve o desastre lá no governo Dilma. O segundo problema é a ideia de tirar o Auxílio Brasil ou Bolsa Família do teto de gastos. Na hora que você tira alguma coisa do teto, isso aí cresce sem limites e acaba afetando também todas as outras despesas, porque as outras ficam comprimidas. E o terceiro problema é uma proposta muito mal desenhada de aumentar investimentos com base em excesso de arrecadação. Não há que se falar em excesso de arrecadação quando se tem déficit no orçamento. Excesso de arrecadação é quando tem dinheiro sobrando, quando tem dinheiro faltando você não vai falar ‘eu vou aumentar a despesa com excesso de arrecadação’, porque não existe isso”, diz Mendes.

O economista Eduardo Giannetti da Fonseca lembra que não atender as promessas de campanha, independente do vencedor, significaria um estelionato eleitoral, mas que, ainda assim, a equação precisa fechar. “O crucial é o entendimento de que passada essa fase excepcional, a dívida pública caminha para uma estabilização e um lento declínio. Mas as duas demandas terão que ser atendidas, a demanda de responsabilidade fiscal e a de responsabilidade social. É possível fazer isso, vai exigir muita competência, muita habilidade, muita liderança e uma equipe econômica que tenha credibilidade junto ao mercado financeiro. O mercado financeiro trabalha muito com expectativas, com o que virá. Essa nova equipe econômica tem que saber atender essas expectativas, apresentando um caminho. E um caminho crível”, defendeu Giannetti.

O cientista político Fernando Luiz Abrucio, coordenador do Centro de Estudos de Administração Pública e Governo da Fundação Getúlio Vargas (FGV) avalia a nova composição do Congresso Nacional, com menor número de partidos políticos. “Com a redução da fragmentação partidária, vai ficar mais fácil para um governo, que seja mais de direita ou centro-direita ou de esquerda ou centro-esquerda, negociar. “Hoje, é muito difícil fazer essa organização. Acho que esse processo ainda vai demorar alguns anos, até 2026, até  a própria lei tem várias fases. Mas nós vamos ter mais clareza sobre os atores políticos e suas ideias. De certa maneira, isso também permite que haja menos aventureiros, partidos de ocasião, isso não é bom para a democracia”, diz. Abrucio ainda avalia que, com o PL do presidente Bolsonaro com maior bancada eleita em 2022, com 99 deputados federais, o futuro bloco governista de Lula, com 68 eleitos pelo PT, a segunda maior bancada, deve avançar no União Brasil, com 59 deputados, MDB e PSD, ambos com 42 parlamentares, além dos partidos de esquerda e os que o apoiaram Lula na campanha eleitoral. No Senado, apesar dos 29 ocupantes vinculados ao bolsonarismo, o cientista política diz que o presidente da casa, Rodrigo Pacheco (PSD), administra uma maioria de 45 senadores de um total de 81 parlamentares.

*Com informações do repórter Marcelo Mattos

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