“Sei que a senhora não tem confiança em mim e no PMDB” diz Michel Temer em carta a Dilma

  • Por Jovem Pan
  • 08/12/2015 07h25
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Romério Cunha Michel Temer

O vice-presidente, Michel Temer, faltou à reunião com Dilma Rousseff e mandou carta em que diz ser um mero “vice-decorativo”. A presidente da República pretendia usar esse encontro para desfazer os rumores de que Temer é favorável ao impeachment.

A situação foi constrangedora porque o vice-presidente não apareceu na reunião com juristas no Planalto. Mais tarde, Dilma Rousseff tentou minimizar a ausência de Michel Temer e anunciou um novo encontro, que também não ocorreu: “Eu prefiro ter a posição que eu sempre tive em relação ao vice-presidente Temer. Ele sempre foi extremamente correto comigo e tem sido assim. Não tem por que desconfiar dele um milímetro. Ele tem conversão bastante comigo e assim que ele chegar em Brasília vou me reunir com ele”.

Na segunda-feira (07/12), o ministro da Secretaria da Aviação Civil entregou oficialmente o cargo. Considerado o braço direito de Michel Temer, Eliseu Padilha garantiu que nem ele, nem o vice-presidente vão coordenar as ações pelo impeachment: “O presidente Michel Temer disse que não vai articular o impeachment e a chance de eu articular é zero. Se a do Michel é zero, a minha é igual. Eu sou aqui um executor daquilo que o presidente do partido vai fazer”.

A presidente da República também defendeu rapidez no processo de impeachment, com a suspensão do recesso parlamentar. Mas, a oposição promete lutar contra a pretensão de Dilma Rousseff, como explica o líder do Democratas na Câmara, deputado Mendonça Filho: “Na tentativa de votar um impeachment quando a opinião pública está desmobilizada no mês de janeiro, mas vamos deliberar essa matéria com justeza, garantindo o direito de defesa da presidente da república, mas fazendo cumprir a lei de impeachment 1079, dos crimes de responsabilidade, e a própria constituição federal”.
À tarde, a presidente da República voltou a criticar o pedido de impeachment. Durante abertura da 10ª Conferência Nacional de Assistência Social, Dilma Rousseff comparou novamente o processo a uma tentativa de golpe.

Alheio às discussões, Michel Temer participou de palestra na Fecomercio, em São Paulo, e depois cancelou a presença em outro evento na capital paulista.

O vice-presidente mandou enviar a carta para Dilma Rousseff e embarcou para Brasília, onde se queixou do vazamento da mensagem.

Confira a carta na íntegra: (Revelada pelo jornalista de O Globo Jorge Bastos Moreno)

São Paulo, 07 de Dezembro de 2015

Senhora Presidente,

“Verba volant, scripta manent” (nt – As palavras voam, os escritos permanecem)

Por isso lhe escrevo. Muito a propósito do intenso noticiário destes últimos dias e de tudo que me chega aos ouvidos das conversas no Palácio.

Esta é uma carta pessoal. É um desabafo que já deveria ter feito há muito tempo.

Desde logo lhe digo que não é preciso alardear publicamente a necessidade da minha lealdade. Tenho-a revelado ao longo destes cinco anos.

Lealdade institucional pautada pelo art. 79 da Constituição Federal. Sei quais são as funções do Vice. À minha natural discrição conectei aquela derivada daquele dispositivo constitucional.

Entretanto, sempre tive ciência da absoluta desconfiança da senhora e do seu entorno em relação a mim e ao PMDB. Desconfiança incompatível com o que fizemos para manter o apoio pessoal e partidário ao seu governo.

Basta ressaltar que na última convenção apenas 59,9% votaram pela aliança. E só o fizeram, ouso registrar, por que era eu o candidato à reeleição à Vice.

Tenho mantido a unidade do PMDB apoiando seu governo usando o prestígio político que tenho advindo da credibilidade e do respeito que granjeei no partido. Isso tudo não gerou confiança em mim, Gera desconfiança e menosprezo do governo.

Vamos aos fatos. Exemplifico alguns deles.

1. Passei os quatro primeiros anos de governo como vice decorativo. A Senhora sabe disso. Perdi todo protagonismo político que tivera no passado e que poderia ter sido usado pelo governo. Só era chamado para resolver as votações do PMDB e as crises políticas.

2. Jamais eu ou o PMDB fomos chamados para discutir formulações econômicas ou políticas do país; éramos meros acessórios, secundários, subsidiários.

3. A senhora, no segundo mandato, à última hora, não renovou o Ministério da Aviação Civil onde o Moreira Franco fez belíssimo trabalho elogiado durante a Copa do Mundo. Sabia que ele era uma indicação minha. Quis, portanto, desvalorizar-me. Cheguei a registrar este fato no dia seguinte, ao telefone.

4. No episódio Eliseu Padilha, mais recente, ele deixou o Ministério em razão de muitas “desfeitas”, culminando com o que o governo fez a ele, Ministro, retirando sem nenhum aviso prévio, nome com perfil técnico que ele, Ministro da área, indicara para a ANAC. Alardeou-se a) que fora retaliação a mim; b) que ele saiu porque faz parte de uma suposta “conspiração”.

5. Quando a senhora fez um apelo para que eu assumisse a coordenação política, no momento em que o governo estava muito desprestigiado, atendi e fizemos, eu e o Padilha, aprovar o ajuste fiscal. Tema difícil porque dizia respeito aos trabalhadores e aos empresários. Não titubeamos. Estava em jogo o país. Quando se aprovou o ajuste, nada mais do que fazíamos tinha sequência no governo. Os acordos assumidos no Parlamento não foram cumpridos. Realizamos mais de 60 reuniões de lideres e bancadas ao longo do tempo solicitando apoio com a nossa credibilidade. Fomos obrigados a deixar aquela coordenação.

6. De qualquer forma, sou Presidente do PMDB e a senhora resolveu ignorar-me chamando o líder Picciani e seu pai para fazer um acordo sem nenhuma comunicação ao seu Vice e Presidente do Partido. Os dois ministros, sabe a senhora, foram nomeados por ele. E a senhora não teve a menor preocupação em eliminar do governo o Deputado Edinho Araújo, deputado de São Paulo e a mim ligado.

7. Democrata que sou, converso, sim, senhora Presidente, com a oposição. Sempre o fiz, pelos 24 anos que passei no Parlamento. Aliás, a primeira medida provisória do ajuste foi aprovada graças aos 8 (oito) votos do DEM, 6 (seis) do PSB e 3 do PV, recordando que foi aprovado por apenas 22 votos. Sou criticado por isso, numa visão equivocada do nosso sistema. E não foi sem razão que em duas oportunidades ressaltei que deveríamos reunificar o país. O Palácio resolveu difundir e criticar.

8. Recordo, ainda, que a senhora, na posse, manteve reunião de duas horas com o Vice Presidente Joe Biden – com quem construí boa amizade – sem convidar-me o que gerou em seus assessores a pergunta: o que é que houve que numa reunião com o Vice Presidente dos Estados Unidos, o do Brasil não se faz presente? Antes, no episódio da “espionagem” americana, quando as conversar começaram a ser retomadas, a senhora mandava o Ministro da Justiça, para conversar com o Vice Presidente dos Estados Unidos. Tudo isso tem significado absoluta falta de confiança;

9. Mais recentemente, conversa nossa (das duas maiores autoridades do país) foi divulgada e de maneira inverídica sem nenhuma conexão com o teor da conversa.

10. Até o programa “Uma Ponte para o Futuro”, aplaudido pela sociedade, cujas propostas poderiam ser utilizadas para recuperar a economia e resgatar a confiança foi tido como manobra desleal.

11. PMDB tem ciência de que o governo busca promover a sua divisão, o que já tentou no passado, sem sucesso. A senhora sabe que, como Presidente do PMDB, devo manter cauteloso silencio com o objetivo de procurar o que sempre fiz: a unidade partidária.

Passados estes momentos críticos, tenho certeza de que o País terá tranquilidade para crescer e consolidar as conquistas sociais.

Finalmente, sei que a senhora não tem confiança em mim e no PMDB, hoje, e não terá amanhã. Lamento, mas esta é a minha convicção.

Respeitosamente,

L TEMER

A Sua Excelência a Senhora

Doutora DILMA ROUSSEFF

DO. Presidente da República do Brasil

Palácio do Planalto

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