Cientista premiada alerta sobre má utilização de tratamentos contra a obesidade
Após descobrir novos tratamentos, química Svetlana Mosjov afirmou que ‘a obesidade é uma doença metabólica e não um problema de força de vontade’, mas que uso de remédios deve ser feito com ‘cuidado e atenção’
Os tratamentos da nova geração contra a obesidade, que se tornaram muito populares em poucos anos, não são “medicamentos milagrosos” e “nunca devem ser tomados por razões estéticas”, alerta Svetlana Mojsov, uma das cientistas que permitiu o seu desenvolvimento. Junto a outros dois pesquisadores, Joel Habener e Lotte Bjerre Knudsen, Mojsov recebeu nesta quinta-feira (19) o prestigiado Prêmio Lasker, muitas vezes considerado um prenúncio de um possível Prêmio Nobel. O trio contribuiu com a revolução ao tratamento da obesidade, uma doença crônica e uma verdadeira crise para a saúde pública, contribuindo para a descoberta e desenvolvimento de medicamentos que permitem uma perda de peso significativa. Ozempic, Wegovy, Mounjaro, Zepbound: prescritos para combater a obesidade ou a diabetes tipo 2 (hiperglicemia frequentemente associada ao excesso de peso), estes tratamentos ganharam tanta popularidade que passaram a ser utilizados por algumas pessoas para perder alguns quilos “extras”.
“O grande sucesso é poder tratar a obesidade e isso é o que devemos nos concentrar”, insistiu a cientista de 76 anos. Em entrevista, a química e o também premiado Joel Habener destacaram as décadas de pesquisas necessárias para o seu desenvolvimento.”Quando você é pesquisador, sonha em descobrir algo que ajude as pessoas”, disse, comemorando que os avanços contribuem para a compreensão de que “a obesidade é uma doença metabólica e não um problema de força de vontade”. A eficácia destes novos medicamentos se deve a uma descoberta: eles simulam um hormônio secretado pelo intestino, chamado GLP-1. Habener, endocrinologista do Massachusetts General Hospital, foi o primeiro a detectar a sua existência, inicialmente em peixes, em 1982.
Mojsov identificou, por sua vez, a sequência ativa do GLP-1, demonstrando sua presença no intestino e sintetizando uma forma pura.Verificou então, em colaboração com outros, que este hormônio estimula a secreção de insulina pelo pâncreas, ajudando a reduzir os níveis de glicose no sangue. Logo, se “convenceu” de que “seria um bom tratamento para a diabetes”. Mas naquela época ninguém suspeitava de sua utilidade contra a obesidade. “Realmente não tínhamos em mente a perda de peso” porque a obesidade não era um grande problema, diz Habener, de 87 anos.
Além disso, na década de 1980 “não havia evidências científicas de que os hormônios regulassem o peso”, acrescenta Mojsov, professora associada da Universidade Rockefeller. Foi apenas por acaso que, durante a realização de grandes ensaios clínicos, os cientistas notaram que os pacientes estavam perdendo peso. Aos poucos, entenderam que o GLP-1 retarda o esvaziamento do estômago, mas também atua no cérebro, influenciando na sensação de saciedade. Uma descoberta decisiva. As empresas farmacêuticas estão rapidamente assumindo o controle.
Na Novo Nordisk, a pesquisadora Lotte Bjerre Knudsen está tentando fazer com que o GLP-1 dure mais do que alguns minutos no corpo com técnicas que visam fazê-lo durar primeiro um dia e depois uma semana. Os demais laboratórios continuam no mesmo caminho. A americana Eli Lilly desenvolveu uma molécula que combina o GLP-1 com outro hormônio gastrointestinal que, segundo Svetlana Mojsov, poderia limitar os efeitos secundários.”Podemos chegar a uma nova geração” que combina diferentes hormônios, diz a cientista premiada, acrescentando que o “Ozempic não é necessariamente a solução final”, mas “abriu o caminho”. Uma das moléculas já foi autorizada contra acidentes cardiovasculares e estudos estão sendo desenvolvidos para tratar apneia do sono, vícios, doenças renais, hepáticas ou mesmo doenças neurodegenerativas (Parkinson, Alzheimer). Para Mojsov, o GLP-1 abre caminho para a ideia de que um medicamento não está reservado para uma única doença.”Até agora falávamos de um medicamento para cada doença. Hoje vemos que o GLP-1 traz uma gama muito mais ampla de benefícios à saúde”, conclui.
*Com informações da AFP
Publicado por Marcelo Bamonte
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