CBF repassa verba, mas dinheiro não chega às atletas do futebol feminino

  • Por Jovem Pan
  • 24/04/2020 22h10
Arquivo Pessoal/Ligia Montalvão Equipe de futebol feminino do Santos Dumont, de Sergipe

Pouco tempo depois da CBF anunciar que faria o repasse de R$ 19,1 milhões para que clubes e federações pudessem cumprir seus compromissos com jogadores, jogadoras e comissões técnicas durante a crise causada pelo coronavírus, o futebol feminino faz um alerta: os valores não estão chegando às atletas.

Ligia Montalvão, que pertence ao Santos Dumont (SE), revelou a página Diário FFeminino, dedicado à modalidade, que a diretoria do clube não dividiu a quantia recebida como deveria. A Série A2 feminina, disputada pela equipe, recebeu R4 1,8 milhão do montante – cerca de R$ 50 mil por equipe. Os problemas das jogadoras começaram aí.

“A CBF mandou a verba referente a duas folhas salariais. Quando o dinheiro chega, ele entra na conta do clube e quem tem é acesso é o presidente. Fizemos uma reunião entre nós, atletas, e decidimos dividir igualmente [25 jogadoras e cinco integrantes de comissão técnica], independente do salário de cada uma. Dias depois, o presidente disse que seria R$ 500 por atleta, isso se a gente quisesse”, conta.

O presidente, identificado apenas como Jó, chegou a mudar de ideia. “Depois, ele lançou uma outra proposta de pagar R$ 1 mil para cada, que daria R$ 30 mil do valor [repassado pela CBF]. Perguntei sobre os outros R$ 20 mil. Ele disse que seria para formar uma nova equipe. Mas esse dinheiro foi dado para arcar com os nossos compromissos. Queremos o valor correto”, diz Lígia.

O empresário local Célio França, que mantinha os vencimentos da equipe, afirma não querer “um centavo” da verba destinada ao Santos Dumont, e defende as atletas. “Fizemos denúncia ao Comitê de Ética da CBF”, disse. França já foi presidente do Confiança, clube sergipano de futebol masculino atualmente na Série B.

O caso chegou ao conhecimento da CBF. O supervisor de competições de futebol feminino da entidade, Romeu Castro, um membro da Confederações falou com o mandatário do Santos Dumont nesta quinta-feira, 23. “Ele informou que fará um aporte às meninas. Parece-me que está havendo uma confusão entre o acordo que há entre o empresário com o clube e a forma que o clube queria fazer a gestão desse dinheiro. Aí é uma questão complicada. Talvez, um erro na formulação do acordo para esse time representar esse determinado clube acaba tendo uma influência negativa agora”, avalia.

“Óbvio que o clube pode utilizar uma parte dos recursos para despesas também relacionadas à modalidade, como comissão técnica, custeio de passagens para as meninas voltarem, que era uma coisa não prevista na crise, mas o lado humano tem sua prioridade. Não podemos entrar em situações que são particulares entre clube e empresário. Essas relações têm que ser melhor definidas para que não haja esse tipo de problema”, completa.

Enquanto isso, a situação preocupa as jogadoras. Segundo Célio, 15 atletas são de fora de Sergipe, oito delas da Bahia, cinco de Alagoas, uma de Roraima e uma de Minas Gerais. Longe de casa, elas não tem como se manter. “Muitas são de famílias muito, muito humildes, que chegaram a não ter o que comer. Eu e minha família chegamos a ajudar, porque muitos pais não estão podendo trabalhar por causa da pandemia”, afirma Lígia. “Mas, a situação está bem complicada. Se não está jogando, não entra dinheiro”, lamenta.

Mais comum do que se imagina

O Santos Dumont não é o único que apresenta problemas na distribuição de recursos. Atletas de outras equipes da Série A2, que assim como no caso da equipe de Sergipe, não têm vínculos profissionais, também procuraram a CBF, algumas sem registrar a denúncia.

Uma das queixas formalizadas foi a das jogadoras do Audax, da primeira divisão feminina, que segundo Castro, já foi resolvida. Os clubes da Série A1 receberam R$ 120 mil cada. A história foi revelada pelo blog Dibradoras, e solucionada logo depois.

Segundo o supervisor da CBF, “a absoluta maioria dos clubes” está cumprindo as obrigações com as atletas. “A CBF se comunicou com os 52 clubes que disputam as competições nacionais de futebol feminino, colhendo informações sobre a situação que atravessavam e as demandas emergenciais. Temos em operação, inclusive, um sistema de monitoramento sobre casos da covid-19 com cada clube, com prioridade à situação clínica, essencial para nortear ações de retorno às atividades. Lembrando que a modalidade opera num regime misto, com uma maioria de equipes não profissionais na Série A2 e um processo sólido de profissionalização na A1. Então, a forma e destino da aplicação dos recursos, obviamente, varia conforme as necessidades de gestão de cada clube”, conclui.

* Com Agência Brasil

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