‘Voto impresso só está na pauta para gerar instabilidade nas eleições de 2022’, diz Rodrigo Maia

Em entrevista à Jovem Pan, ex-presidente da Câmara analisou atual conjuntura política e possíveis contextos para o próximo pleito: ‘Bolsonaro deve ser lembrado como um erro que não deve se repetir’

  • Por Giullia Chechia Mazza
  • 18/07/2021 14h00
Frederico Brasil/Estadão Conteúdo Rodrigo Maia é o atual presidente da Câmara dos Deputados Maia é o primeiro parlamentar da história a comandar por três vezes a Câmara dos Deputados

O deputado federal Rodrigo Maia (sem partido) sentou-se à cadeira da Presidência da Câmara dos Deputados por quatro anos e sete meses. Assumindo o cargo em julho de 2016, depois da renúncia do então presidente Eduardo Cunha, Maia foi reeleito nos pleitos de 2017 e 2019 — o que fez com que atingisse o feito de ser o primeiro parlamentar da história a comandar por três vezes a Casa. Em tom emocionado, ele se despediu do posto em fevereiro deste ano, repassando a responsabilidade para o atual presidente da Câmara, Arthur Lira (PP). Em entrevista à Jovem Pan, o político criticou o governo do atual presidente Jair Bolsonaro (sem partido), esclareceu os motivos que o levaram a não abrir um processo de impeachment contra o chefe do Executivo e revelou suas apostas para as eleições de 2022 — enfatizando a função do debate sobre o voto impresso. Confira os principais pontos.

Apostas para as eleições de 2022

Em meio a debates acalorados, a sociedade já discute os possíveis cenários políticos que desenharão o pleito eleitoral de 2022. Mesmo que os rascunhos estejam bem elaborados, Maia analisa que o quadro ainda não está fechado. “O presidente Lula é o que me parece mais sólido para 2022. No entanto, acho que há espaço para o crescimento de uma alternativa à polarização entre Lula e Bolsonaro, para um projeto que questione o posicionamento do PT e consiga pulverizar as possibilidades do atual presidente avançar para o segundo turno. Hoje, o Brasil precisa de uma união dos campos distintos para que, nos próximos anos, possamos vivenciar um país com menos crises políticas. Aliás, talvez Bolsonaro não seja eleito, mas não pode ser esquecido pela sociedade. Mesmo um presidente tão ruim para as instituições e para os brasileiros deve ser lembrado, só assim não cometeremos os mesmos erros. Brasileiros devem lembrar de Bolsonaro como um erro que não deve se repetir a partir de 2022″, afirmou. Os nomes que integram as apostas do deputado para a terceira via são o do atual governador de São Paulo, João Doria (PSDB), e do ex-governador do Ceará, Ciro Gomes (PDT).

Construção de um caminho alternativo

Mesmo sem se projetar diretamente no pleito eleitoral de 2022, o político se coloca à disposição para “construir um caminho alternativo”. “Quero participar de um projeto em meu campo político. Um projeto que entenda a importância da economia liberal, mas também compreenda o papel do Estado para reduzir desigualdades e coordenar as ações fundamentais do serviço público — como a saúde, a educação e a segurança. Em 2022, quero promover algo que ajude o país a crescer com sustentabilidade, se desenvolver e gerar empregos.”

Contra a implementação do voto impresso

Levantando uma questão relativa ao próprio processo eleitoral, o ex-presidente da Câmara se posicionou de forma contrária à implementação do voto impresso. “Espero que a Câmara rejeite a PEC do voto impresso ainda na Comissão porque a intenção deste projeto não é aprimorar o sistema, mas questioná-lo. Todo ato que questiona o Estado Democrático de Direito precisa ser rechaçado. Aliás, o parlamento deveria se apressar para rejeitar a proposta, assim poderia se ocupar com o que realmente importa: a vacinação e os índices crescentes de desemprego, inflação e informalidade. O voto impresso só está na pauta do governo para gerar instabilidade no processo eleitoral de 2022.” Para evitar a derrota da proposta de emenda à Constituição (PEC) que prevê a implementação do voto impresso nas eleições, nesta sexta-feira, 16, os deputados governistas conseguiram adiar para agosto a votação do projeto na Comissão Especial que analisa o tema. Recentemente, o chefe do Executivo chegou a colocar em xeque a realização do pleito sem a aprovação da PEC. No entanto, para Maia, a solidez das Forças Armadas, do Congresso e do Supremo Tribunal Federal (STF) “colocam as chances de um golpe institucional em um caminho de pouquíssima probabilidade”.

Aprofundamento da crise política

Crítico à gestão de Bolsonaro, o ex-presidente da Câmara dos Deputados considerou que, cada vez mais, a “crise política está se aprofundando”. Para Maia, os efeitos da CPI da Covid-19 estão minando a estabilidade do governo, já que a comissão instalada no Senado levantou uma série de suspeitas relacionadas às negociações de imunizantes contra o coronavírus. “Apesar de ainda contar com apoio político, a crise em torno do Executivo está se aprofundando porque a CPI da Covid-19 está provocando um grande desgaste do governo. Com a CPI, Bolsonaro passou a enfrentar problemas relacionados à corrupção, um tema que sempre tratou com bastante arrogância. Todas as denúncias estão enfraquecendo a gestão. Fora o que já sabíamos: a total falta de coordenação e projeto de governo para o país. Mesmo que exista um crescimento econômico, este só atinge o agronegócio e empresas na Bolsa de Valores. A inflação está destruindo o poder de compra dos brasileiros mais simples e da classe média — o que representa a maioria da sociedade. Sob o ponto de vista político, seguiremos vivenciando o agravamento da crise tendo as decisões do parlamento e do Supremo contestadas pelo presidente”, disse o parlamentar.

Processo de impeachment de Bolsonaro

Mesmo considerando que o governo está enfraquecendo, Maia descarta as chances de Bolsonaro ser deposto da Presidência. Até agora, a gaveta da mesa de Lira, presidente da Câmara, acumula 126 pedidos de impeachment contra o chefe do Executivo. “Há apoio político, mas essa base está custando muito para o Estado brasileiro. Ao passo em que a popularidade de Bolsonaro cai, as alianças do Congresso se fortalecem porque o governo está abrindo o caixa para o parlamento. Para se ter uma ideia, 53% dos recursos destinados aos investimentos públicos permaneceram retidos no parlamento neste ano. O governo Michel Temer, assim como o de Bolsonaro, enfrentou um grande desgaste, mas conseguiu manter apoio porque tinha um bom diálogo no Congresso. Já no governo Bolsonaro, em cada votação da Casa, o Ministério da Economia abre o caixa e mantém a base política às custas do orçamento público e das famílias brasileiras”, disse.

Seguindo a linha de raciocínio, o deputado afirmou que “Bolsonaro chega muito desgastado ao fim do mandato”. Enquanto esteve à frente da Câmara, Maia teve o poder de abrir um dos pedidos de impeachment protocolados na Casa. No entanto, não o fez. Questionado sobre os motivos que o levaram a não dar prosseguimento ao impedimento de Bolsonaro, mesmo sendo um grande crítico à gestão, o parlamentar analisou que o processo “fortaleceria ainda mais o governo”. “Naquela época, a Câmara não somava a quantidade de votos necessária para dar continuidade ao impeachment. O processo seria derrubado e isso fortaleceria ainda mais o governo Bolsonaro. Em relação à popularidade, as condições eram boas porque a base eleitoral do presidente estava minguando. Desde então, a crise segue se aprofundando e, hoje, a situação de Bolsonaro é muito pior do que há um ano. Mesmo assim, a probabilidade de um impeachment prosperar é muito pequena”, concluiu.

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