Banco Central mantém Selic a 2% pela quarta vez consecutiva

Copom congela taxa de juros ao menor patamar da história apesar do aumento da inflação; fim do auxílio emergencial, desemprego e valorização do real devem tirar pressões que empurraram o IPCA no ano passado

  • Por Jovem Pan
  • 20/01/2021 18h35 - Atualizado em 20/01/2021 18h48
Divulgação/Instagram Banco do Central Prédio do Banco Central à noite Membros do Banco Central se reúnem a cada 45 dias para definir os rumos da política monetária nacional

Comitê de Política Monetária do Banco Central, o Copom, manteve, nesta quarta-feira, 20, a taxa básica de juros da economia brasileira, a Selicem 2% ao ano, o quarto congelamento consecutivo após nove cortes seguidos iniciados em julho de 2019, quando estava em 6,5% ao ano. A redução ao nível mais baixo da história foi anunciado em agosto de 2020 e mantida nas três últimas reuniões do colegiado. A permanência da taxa ocorre mesmo após a disparada de 4,52% da inflação nacional em 2020, acima do esperado pelo mercado financeiro, puxada principalmente pelo encarecimento dos alimentos. A decisão do Banco Central está em sintonia com o aguardado por economistas e entidades. Para analistas, a taxa de juros deverá se manter nesse patamar até o término do primeiro semestre, para então iniciar um movimento de subida gradual. Segundo o Boletim Focus divulgado nesta segunda-feira, 18, a Selic irá encerrar o ano em 3,25%. O hiato até junho é encarado como o suficiente para observar o desempenho da economia brasileira no pós-pandemia diante do aumento do desemprego e do fim do auxílio emergencial. Os primeiros seis meses do ano também revelarão os impactos que o início da imunização contra a Covid-19 terão na recuperação das atividades. “Mesmo com o risco de alta para a inflação neste ano, entendemos que não haverá pressa para elevar a taxa Selic. O choque de inflação ainda parece temporário, o desemprego se manterá elevado e a política monetária exercerá um papel maior para sustentar a retomada da economia com a retirada dos programas fiscais”, afirma Caio Megale, economista-chefe da XP Investimentos.

Pela primeira vez desde agosto de 2020, o Copom retirou o foward guidance, também conhecido como prescrição futura, que indicava a manutenção da taxa de juros em viés de baixa. Segundo o colegiado, os resultados alcançados com a política já foram satisfeitos. “Como consequência, o forward guidance deixa de existir e a condução da política monetária seguirá, doravante, a análise usual do balanço de riscos para a inflação prospectiva. O Comitê reitera que o fim do forward guidance não implica mecanicamente uma elevação da taxa de juros pois a conjuntura econômica continua a prescrever, neste momento, estímulo extraordinariamente elevado frente às incertezas quanto à evolução da atividade”, afirmou. O Copom mostrou preocupação com o aumento de casos de Covid-19 e o aparecimento de novas cepas do vírus, mas afirmou que “novos estímulos fiscais em alguns países desenvolvidos, unidos à implementação dos programas de imunização contra a Covid-19, devem promover uma recuperação sólida da atividade no médio prazo.” No cenário brasileiro, os técnicos do Banco Central afirmaram que a recuperação da economia se mostra surpreendente, “mas não contemplam os possíveis efeitos do recente aumento no número de casos de Covid-19. Prospectivamente, a incerteza sobre o ritmo de crescimento da economia permanece acima da usual, sobretudo para o primeiro trimestre deste ano, concomitantemente ao esperado arrefecimento dos efeitos dos auxílios emergenciais.” O Copom também se mostrou ciente do aumento da pressão inflacionária nos próximos meses, mas mantém o diagnóstico de que os “choques atuais são temporários, ainda que tenham se revelado mais persistentes do que o esperado.”

Esta foi a primeira reunião do colegiado em 2021. Os técnicos da autoridade monetária se reúnem a cada 45 dias, e o próximo encontro está agendado para 16 e 17 de março. A Selic é a principal ferramenta do BC para manter a inflação, como é chamada a variação de preços, em equilíbrio. Em suma, ela é usada para estimular ou frear a economia, de acordo com a alta ou baixa do quanto se paga por algo. Quando há disparada nas gôndolas, o Copom aumenta a taxa básica de juros para frear o consumo e forçar a queda. Em um cenário oposto, o Banco Central reduz a Selic para estimular a circulação do dinheiro. O Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), medidor oficial da inflação brasileira, fechou 2020 com avanço de 4,52%, acima do centro de 4% perseguido pela autoridade monetária nacional, mas dentro dos limites de 2,5% e 5,5%. O valor é o maior desde 2016 e veio acima do esperado pelo mercado financeiro. Economistas e entidades consultados pelo BC estimavam que o IPCA encerrasse 2020 com alta de 4,37%, segundo números do Boletim Focus. A disparada do preço dos alimentos foi o principal vilão para a inflação no ano passado. A alta de 14,09% foi puxada principalmente pelo encarecimento de 103,79% do óleo de soja e 76,01% do arroz. O aumento do grupo foi o maior desde 2002, quando fechou com avanço de 19,47%.

A pressão inflacionária foi resultado de uma “tempestade perfeita” causada pela pandemia do novo coronavírus na economia do mundo inteiro. Com as restrições impostas pelas medidas de isolamento social, os brasileiros passaram a consumir mais alimentos em casa, aumentando a demanda sobre esses produtos. Ao mesmo tempo, a recuperação antecipada de outros países, principalmente da China, fez crescer a procura por alimentos, em especial a carne, o arroz e a soja (que é usada como ração para criação de animais), entre outras commodities. Além de não ter opção de comer fora, o auxílio emergencial distribuído pelo governo federal aumentou o poder de consumo de milhões de brasileiro e impulsionou as vendas de diversos setores, como o de material de construção e eletrônicos, além do próprio grupo de alimentos e bebidas. Em paralelo a essa mudança de comportamento dentro do país, a crise econômica fez o real desvalorizar muito ante o dólar. A queda do câmbio favoreceu as exportações, fazendo com que os produtores dessem preferência para as vendas internacionais, prejudicando ainda mais o mercado doméstico. Por outro lado, o fortalecimento da divisa norte-americana aumentou os custos para a importação, e produtos que têm em sua base insumos ou matérias-primas de outros países acabaram encarecendo nas prateleiras.

O Conselho Monetário Nacional (CMN) determinou o centro da meta de 2021 em 3,75%, com margem para flutuar no intervalo de 2,25% e 5,25%. Para analistas, a manutenção da Selic em 2% ao ano está dentro da realidade diante da ausência das principais pressões que forçaram a guinada do IPCA em 2020. A falta do auxílio emergencial irá reduzir o poder de compra, enquanto o aumento do desemprego, que já está batendo recorde, também será uma trava ao consumo. Já no câmbio, o dólar da indicativos de desvalorização nos próximos meses, principalmente após a aprovação do pacote de US$ 1,9 trilhão do recém-empossado presidente dos Estados Unidos, Joe Biden. O arrefecimento da moeda tirará parte da pressão sobre itens importados, impactando no barateamento de uma série de produtos. O compromisso do governo federal com a responsabilidade fiscal é o principal fator que pode alterar esse caminho. Caso haja aumento de despesas que rompam o teto de gastos, o dólar volta a disparar diante da insegurança que o país representará aos investidores estrangeiros. Essa fuga de capitais forçará o Banco Central a elevar a Selic para equilibrar os preços. “É preciso ficar atento também para o aumento do risco fiscal, a depender do desfecho da eleição nas casas legislativas. Se estes riscos se materializarem, o Copom tende a elevar os juros antes – possivelmente em maio, quando o conjunto de informações sobre esses riscos e sobre o efeito do fim do auxílio emergencial estará mais completo”, diz Megale, da XP investimentos.

O que é Copom

Comitê de Política Monetária (Copom) é um órgão constituído em 1996 no âmbito do Banco Central do Brasil com as finalidades de estabelecer as diretrizes da política monetária e definir a taxa básica de juros da economia brasileira. Tem, ainda, a competência específica de regular a liquidez da economia, por meio dos instrumentos de política monetária. O Copom se reúne a cada 45 dias. No primeiro dia do encontro, são feitas apresentações técnicas sobre a evolução e as perspectivas das economias brasileira e mundial e o comportamento do mercado financeiro. No segundo dia, os membros do colegiado, formado pela diretoria do BC, analisam as possibilidades e definem a Selic.

O que é Selic

Selic é a taxa básica de juros da economia brasileira. Os juros são usados pelo Banco Central como uma ferramenta para tentar controlar a inflação, pois a alta ou a queda dos juros influencia o consumo das famílias e a tomada de crédito no país. De modo geral, quando a inflação está alta, o BC sobe os juros para reduzir o consumo e forçar os preços a cair. Quando a inflação está baixa, o BC derruba os juros para estimular o consumo. A Selic tem influência em todas as taxas de juros do país, como a dos empréstimos, financiamentos e das aplicações financeiras. Quando o BC altera a meta da Selic para baixo, a rentabilidade dos títulos atrelados a ela cai e, com isso, o custo dos bancos também diminui. Assim, uma redução da Selic, por exemplo, deve fazer com que os juros cobrados pelas instituições financeiras em empréstimos também caiam. O contrário ocorre quando a Selic sobe: o custo dos bancos aumenta e eles passam a cobrar mais pelos empréstimos.

Comentários

Conteúdo para assinantes. Assine JP Premium.